Décadas passadas jogador de futebol nem sempre
tinha postura profissional. Varava madrugadas em ‘gandaias’ com mulherada,
jogatina de baralho ou bebedeira em botecos. Dedicação
aos estudos era raridade. Assim, quando pendurava as chuteiras vagava por aí
sem profissão e ‘queimava’ o dinheiro juntado ao longo da carreira.
As entrevistas eram inócuas ou marcadas pelo
‘decoreba’, com derrapadas na língua portuguesa. No rádio, as primeiras
palavras eram ‘ouvintes meus cumprimentos’. E no pós-jogo, em caso de derrota,
o discurso não fugia de ‘vamos erguer a cabeça e partir para a próxima’.
Quem sugere que o saudoso meia Sócrates do
Corinthians foi uma das raras exceções de doutorado entre boleiros, quando formado
em medicina no final dos anos 70, tem que recorrer ao histórico da década de 60
na bola quando o rebelde e politizado Afonsinho, do Botafogo (RJ), também fez a
mesma opção.
O histórico de atletas-médicos aumenta no
Atlético Mineiro. Mário de Castro jogou de 1926 a 1931 com o nome falso
de Orian para driblar a exigente mãe, uma viúva que queria impedi-lo de jogador
futebol. Assim, ele cursou medicina simultaneamente e foi clinicar quando parou
de jogar. Já na década de 60 dois companheiros de equipe no Galo mineiro formaram-se
médicos após o encerramento da carreira, casos do meio-campista Haroldo Lopes e
goleiro Marcial de Mello Castro.
Marcial foi profissionalizado no Galo mineiro
em 1960, ameaçou parar na temporada seguinte, mas foi convencido pelo técnico
Antoninho a voltar. E se destacou pela agilidade e boa colocação no time campeão
estadual de 1962 formado por Marcial; Reginaldo, William, Procópio e
Marcelinho; Dinare e Fifi; Toninho, Nilson, Afonsinho e Noêmio.
Flamengo foi o destino de Marcial no ano
seguinte e conquistou novo título regional, com a marca de ter sustentado o
empate sem gols contra o Fluminense com brilhantes defesas. Aquela final, em
fevereiro de 1963 no Estádio do Maracanã, registrou o recorde de público entre
clubes no planeta, com 177.656 pagantes e 194.603 presentes. Eis a equipe
rubro-negra: Marcial; Murilo, Luís Carlos, Ananias e Paulo Henrique; Carlinhos
e Nelsinho; Espanhol, Airton, Geraldo e Osvaldo.
Em 1966 Marcial já estava no Corinthians e se
revezava na meta com Mário, Cabeção e Heitor. Eis o time: Marcial; Jair
Marinho, Ditão, Clóvis (Galhardo) e Édson Ceconha; Dino Sani e Nair; Marcos,
Nei, Tales, Rivelino e Gilson Porto. Lá ele encerrou a carreira no ano seguinte
aos 26 anos de idade quando o revezamento no gol era com Barbosinha. Marcial preferiu
destrancar a matrícula do terceiro ano curso de medicina quando morava em Belo Horizonte. E
lá se especializou como anestesista.
Agora, aos 73 anos de idade, ele acha tempo
para freqüentar o Boteco do Chumba na capital mineira e adora pescar traíras em
lagoas.
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