segunda-feira, 27 de agosto de 2012


Goleiro Félix e o cigarro


 A morte do goleiro Félix no dia 24 de agosto, em decorrência de enfisema pulmonar, provoca remissão ao maligno vício do cigarro. Essa tentação vai destruindo a pessoa lentamente até atingir processo irreversível. E foi o caso de Félix aos 74 anos de idade.

 Cada ano são programadas duas datas para campanhas de conscientização aos fumantes sobre os riscos das tragadas: 31 de maio é tido como o Dia Internacional de Combate ao Tabagismo, enquanto é reservada a data de 29 de agosto para o mesmo combate, porém de caráter nacional.

 O humorista Chico Anysio, que morreu em março passado, culpou o tabagismo para o agravamento de doença em seus pulmões. Por isso, já no fim da vida, fez campanha contra o cigarro. Talvez até o próprio Félix tenha pensado o mesmo.

 Nas manifestações de condolências de ex-companheiros tricampeões pela Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1970, no México, a lembrança do maldito vício do cigarro: “O Félix dava uns tragos até nos intervalos das partidas”, testemunhou o zagueiro Brito. “Ele fumava muito”, emendou o lateral-direito da época, Carlos Alberto Torres.

 Nas redes sociais, o meia-armador Paulo César Caju também tocou no assunto: “Por causa do cigarro, ele tinha uma tosse muito feia”. Caju não se restringiu à manifestação sobre o tabagismo do companheiro. Também saiu em defesa dele com o argumento de que foi um bom goleiro naquela Copa.

 “Contra a Inglaterra ele fez belas defesas quando o jogo estava zero a zero. Contra a Itália, depois do empate (1 a 1), praticou duas ou três boas defesas”, escreveu em seu blog pessoal, o Blog do Caju.

 Claro que Félix Mielli Venerando não foi unanimidade. Recebeu críticas por atuações naquela Copa do Mundo. Naquele timaço de 1970, foi identificado mais pelas falhas do que as defesas importantes. E quando instigado sobre a polêmica, contra-atacou: "Todos diziam que a Seleção tinha um time, mas não tinha goleiro. Eu provei que podia ser titular".

 Félix atuou pela Seleção Brasileira 48 vezes. A estréia foi no dia 21 de novembro de 1965, no Estádio do Pacaembu, na vitória sobre a Hungria por 5 a 3, onze anos depois de estrear no profissionalismo, no Juventus (SP).

 No ano seguinte transferiu-se para a Portuguesa, mas por longo período ficou na reserva de Cabeção e Carlos Alberto. Titular só a partir de 1964, e de vez em quando participava de revezamento com Orlando Gato Preto.

 Numa excursão da Portuguesa aos EUA, no jogo contra o Massachusetts, de Nova York, Félix foi jogar no ataque quando seu time massacrava por 9 a 0, e ele fez o décimo gol. O resultado do jogo foi 12 a 1.

 Félix ganhou visibilidade na carreira quando se transferiu para o Fluminense, clube que defendeu de 1968 a 1977, quando encerrou a carreira. Apesar disso, só recentemente, após reformulação do site oficial do clube, o seu nome foi incluído na galeria de ídolos.

 


Geraldão prometia marcar gols e cumpria



 Se hoje o tom das entrevistas de boleiro gira em torno de ‘nosso time está focado’, no passado ele era destemido e sobretudo marqueteiro na promoção de jogos. Atacantes goleadores confiavam no ‘taco’ e não se acanhavam em prometer gols. Dadá Maravilha, por exemplo, dava nome a cada gol prometido.

 O raçudo centroavante Geraldão também participou da farra de prometer gols. Em 1982, numa decisão de título regional de seu Inter (RS) contra o rival Grêmio, chamou a imprensa e prometeu título ao colorado com dois gols dele.

 Que ousadia desse Geraldão! Já havia feito três gols em partida válida pelo primeiro turno e abusava de provocação na finalíssima, avisando que entraria para a história do clássico gaúcho como único jogador a marcar cinco gols em dois jogos.

 Pois quem foi no Estádio Olímpico viu os tais gols prometidos por Geraldão no seu estilo inconfundível de repartir com zagueiros bola cruzada e empurrá-la para o gol.

 Claro que o pôster daquela equipe de 1982 o hoje senhor Geraldo da Silva guarda com carinho em seu acervo particular. Aquele time? Benitez; Luís Carlos Winck, Mauro Pastor, Mauro Galvão e André Luiz; Ademir, Dunga e Ruben Paz; Silvinho, Geraldão e Beto. O treinador era Dino Sani.

 O gremista odiou Geraldão. Primeiro, porque ele era carrasco de seu time. Depois, porque o atleta ficou devendo melhor rendimento na passagem pelo Estádio Olímpico um ano antes.

 Geraldão tinha a sina de brilhar contra rivais. Foi assim nos tempos de Botafogo de Ribeirão Preto de 1970 a 1975. Bastava a tabela do Campeonato Paulista programar Come-Fogo (Botafogo x Comercial) para os comercialinos tremerem na base.

 Geraldão foi artilheiro do Paulistão de 1974 com 24 gols, no time botafoguense formado por Jorge; Ferreira, Paulo Cesar, Eraldo e Mineiro; João Carlos, Cunha e Sócrates; Ferreirinha, Geraldão e Nenê.

 Em 1975, o então presidente do Corinthians, Vicente Matheus, o contratou jamais imaginando que ele se transformaria em carrasco do São Paulo. E com aqueles 23 gols marcados no Paulistão de 1977 ajudou o clube a quebrar um jejum de títulos que se aproximava de 23 anos.

 Aquele time corintiano, comandado pelo treinador Oswaldo Brandão, contava com Tobias; Zé Maria, Moisés, Ademir Gonçalves e Wladimir; Russo, Luciano e Basílio; Vaguinho, Geraldão e Romeu Cambalhota.

 Em 1978 Geraldão foi emprestado ao Juventus, mas retornou ao Corinthians no ano seguinte, caracterizando um histórico de 278 jogos pelo clube, com 90 gols.

 A partir de 1985 começou o calvário do atacante no futebol, com repasse a pequenos clubes, um deles o extinto União Valinhos. Ele passou ainda por Francana, Corinthians de Presidente Prudente, Itararé e Garça em 1989, quando encerrou a carreira. Hoje, aos 63 anos de idade, ainda joga no time de máster do Corinthians.


segunda-feira, 13 de agosto de 2012


Mauro Cabeção, boleiro da noite


 O assassinato do lateral-direito Marcos Campos Júnior, o Mauro Cabeção de Guarani, Portuguesa, Santos, Grêmio (RS) e Cruzeiro, aos 48 anos de idade, no dia 6 de agosto de 2004, é um exemplo claro de como a Justiça brasileira caminha a passos de tartaruga.

 O pintor Felipe Delgado, autor dos disparos, escondeu o rosto com um capuz, mas a polícia desvendou o assassinato qualificado. Aí, restou a confissão de que topou praticar o crime em troca de R$ 4 mil, com posterior condenação pela Justiça de Nova Odessa (SP) a 13 anos de prisão em 2007.

 A professora Gislene Ribeiro Giroldi, acusada de mandante do assassinato, cumpriu prisão preventiva por um período e só foi condenada à prisão, igualmente de 13 anos, no dia 17 de junho passado. Apesar disso, ficará em liberdade ao ingressar com recurso no Tribunal de Justiça.

 Como a previsão do futuro julgamento é de no mínimo 18 meses, até lá ela ficará em liberdade, assim como ficou desde 2009 quando seus advogados obtiveram habeas corpus para que se livrasse da prisão.

 Mauro Cabeção foi assassinado com seis tiros em uma bar na periferia de Nova Odessa. À noite, como ninguém é de ferro, encostava em balcão de bar e não fazia distinção de bebidas, desde que fossem alcoólicas. Assim foi tocando a vida até a morte.

 A versão foi de crime passional e encomendado. Dias antes da morte, a vítima havia registrado boletim de ocorrência de ameaça, com relato de um triângulo amoroso, com envolvimento de sua companheira e outra mulher.

 No futebol, Mauro tentou evitar o apelido de cabeção, porém sem sucesso. Ele estava aposentado com míseros salários e por isso compensava o rendimento inicialmente com o emprego de porteiro no ginásio de esportes do Guarani. Posteriormente foi transferido para uma escolinha de futebol mantida pelo clube.

 De fato Mauro tinha muito a ensinar à garotada, a começar pelo comportamento fora de campo. Mostrava que beber, fumar e se divertir em boates, resultando em noites mal dormidas, interferem diretamente no condicionamento físico do atleta.

 Mauro podia dizer que era uma das raras exceções neste aspecto porque tinha um físico privilegiado, que permitia defender e atacar de forma consciente. Parava hábeis ponteiros-esquerdos na botinada, se preciso fosse. E quando chegava ao fundo do campo, o cruzamento geralmente encontrava o atacante de frente para o gol.

 Ele teve passagens na equipe principal da Seleção Brasileira em três vezes na década de 70. Também participou dos Jogos Olímpicos de Montreal, no Canadá, em 1976.

 No final de uma carreira de pouco mais de dez anos, como não fazia o vaivém constante, optou pela fixação no miolo de zaga, a exemplo dos laterais Carlos Alberto Torres, Leandro e Djalma Santos. Na época, exigia-se de laterais boa impulsão para coberturas no meio da área, facilitando a adaptação.
 

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Cantarele, um reserva que sempre entrava



 Há fatos curiosos no futebol em que você nem deve procurar explicação, um deles bons goleiros do passado admitirem passivamente a condição de reserva em suas respectivas equipes.

 Nos anos 60, o goleiro Laércio Milani, já falecido, perdeu a condição de titular do Santos com a chegada de Gilmar dos Santos Neves, que havia deixado o Corinthians. E você pensa que Laércio ficou incomodado com a reserva?  Absolutamente. “Prefiro ser o segundo goleiro no Santos a titular em outra equipe”, costumava repetir.

 Quase no final dos anos 70, o São Paulo foi buscar no Tiradentes do Piauí o ágil e folclórico goleiro Toinho, para ficar na reserva de Waldir Peres, e não deixar a ‘peteca’ cair quando das convocações do titular à Seleção Brasileira, ou em casos de contusões.

 O piauiense Toinho - hoje com 60 anos cravados - até esnobava na saída de bola com os pés. E naquele entra e sai da equipe, entre 1977 a 1982, jogou 130 partidas sem jamais reclamar do posto de reserva no São Paulo.

 Também o ex-goleiro Cantarele, do Flamengo, está inserido neste contexto de conformismo com a reserva. Claro que foi um goleiro que pegava as chamadas bolas defensáveis e a exigência do ‘Mengão’, na época, era de jogador acima da média em qualquer posição.

 Seja como for, o diferencial dele para os exemplos já citados foi o longo período vinculado ao clube e a alternância de fases como titular. A passagem como atleta do Flamengo de 1973 a meados de 1990 possibilitou que jogasse em 549 partidas, número que o coloca como sexto atleta que mais atuou pelo clube em sua história. E tem-se que considerar o empréstimo ao Náutico em 1983.

 Antonio Luís Cantarele, mineiro de Além Paraíba, vai completar 59 anos de idade em setembro, sem jamais ter pedido raízes do Flamengo. Até hoje está ligado ao clube, agora na função de preparador de goleiros.

 Como contemporâneo do ex-meia Zico, ambos mantém laços de amizade e confiança. Por isso Cantarele trabalhou com o companheiro na seleção de futebol do Japão e Fenerbahçe da Turquia.

 Para os seus discípulos, Cantarele tem muito a contar sobre a responsabilidade de o reserva se preparar adequadamente para entrar no time. Foi assim quando cedeu o lugar para o goleiro Raul Plasmman, que chegou à Gávea em 1978, e lá ficou até 1983, quando se despediu do futebol aos 38 anos de idade.

 Cantarele nem teve outra real chance e já estava no clube o goleiro argentino Ubaldo Fillol, que havia disputado as Copas de 1978 e 1982. O time do Flamengo na Libertadores de 1984 foi de Fillol; Leandro, Figueredo, Mozer e Júnior; Andrade, Adílio e Tita; Lúcio, Nunes e João Paulo.

 Fillol jogou duas temporadas no Flamengo e o seu real substituto foi Zé Carlos, que havia sido contratado do Rio Branco (ES), e integrou à Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1990, ano em que Cantarele resolveu parar, aos 37 anos de idade.