quarta-feira, 29 de julho de 2009

Adeus a Zé Carlos

Que bom seria se o dito popular “quem aqui faz aqui paga” correspondesse à verdade. Cafajestes receberiam o duro castigo e o exemplo desencorajaria seguidores. Paradoxalmente esses inescrupulosos continuam por aí “vendendo” saúde, enquanto gente de bem morre aos 47 anos de idade, caso de Zé Carlos, goleiro do Flamengo nos anos 80.
Quis o destino que o mortífero câncer no abdômen vitimasse o carioca José Carlos da Costa Araújo no início deste ano. Se o rastreamento fosse precoce, a chance de cura seria maior. Com o diagnóstico tardio, disseminação da doença no organismo, a recuperação ficou muito difícil. Na literatura médica, na década passada, esse era o maior caso de morte por câncer no mundo.
Somos egoístas. Não aceitamos que um ente querido vá embora em qualquer circunstância. Esquecemos o quanto o paciente sofreu antes da morte. No caso específico de Zé Carlos, estava internado desde o início de junho no Hospital Ordem Terceira da Penitência, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, e morreu no dia 24 de julho, 20 quilos mais magro.
É justificável a aversão pelo tema morte, porque não há receita que abrande a dor de quem fica. Assim, após considerações indispensáveis, convém recapitular a carreira de altos e baixos de Zé Carlos.
O estágio inicial deu-se no Americano de Campos (RJ) e Rio Branco (ES). Como correspondeu praticando defesas difíceis, despertou interesse do Flamengo. Foi contratado para substituir Raul Plassman, em 1984, e lá jogou ao lado de craques renomados como os laterais Leandro e Júnior, meia Zico e atacante Bebeto. Logo, comemorou títulos de campeonatos estadual, brasileiro e Copa do Brasil.
A boa fase o levou inicialmente à seleção olímpica de futebol em 1988, em Seul, Coréia do Sul, voltando com a medalha de prata. Também foi recompensado com convocação à Seleção Brasileira para a Copa do Mundo de 1990, na Itália, embora na condição de segundo reserva de Taffarel. O primeiro foi o então vascaíno Acácio.
Em 1991, com a chegada do técnico Vanderlei Luxemburgo na Gávea, o ex-são-paulino Gilmar Rinaldi foi fixado como goleiro do Flamengo. Ao perder espaço, restou a Zé Carlos topar a transferência para o Cruzeiro, passagem pelo futebol português, e retornou ao rubro-negro cinco anos depois. E foi na segunda passagem pelo clube carioca que entrou para a história como o segundo goleiro a marcar gol com aquela camisa. Foi através da cobrança de pênalti num jogo contra o Nacional (AM), no Estádio Vivaldo Lima, em Manaus, em 1997. Antes, Ubirajara havia marcado em jogo contra o Madureira, pelo Campeonato Carioca, na Ilha do Governador, em 1970. Na reposição, com o forte vento, a bola ganhou força e traiu o goleiro adversário.
Depois do Flamengo, Zé Carlos percorreu a estrada da volta no futebol, com passagens por Vitória (BA), XV de Piracicaba (SP), América (RJ) e Tubarão (SC). A carreira de jogador foi encerrada em 2000.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Fogos, relação com futebol

Aquela tonelada de fogos de artifícios encalhada com a derrota do Cruzeiro para o Estudiantes na final da Libertadores, dia 15 de julho, foi usada no jogo subseqüente contra o Corinthians, no Estádio Mineirão, pelo Campeonato Brasileiro, no show pirotécnico ainda permitido em estádios.
Estampidos provocados por rojões são um aviso, entre outras coisas, que algum time de futebol marcou gol, que o telespectador está vibrando com a vantagem de seu clube. Por questão de segurança, desde meados da década de 70, proibiram o acesso de torcedores com fogos nos estádios. Eles se transformaram em armas nos confrontos de torcidas rivais.
A rigor, na década de 40, quando as torcidas tinham comportamento civilizado, no lugar de alambrados via-se cercas de madeira de 1m de altura. Nos anos 50, nem era preciso revistar torcedores nos portões de entrada dos estádios. Nos anos 80, foi necessário um pacote de medidas para garantir segurança durante os jogos. Impediram acesso de bandeira com mastro inferior a 4m de altura, instrumento de percussão, guarda-chuva de ponta e até radinho de pilha, uma das medidas posteriormente revogada.
Quando o torcedor fazia festa nos campos soltando rojões, pessoas nas imediações acompanhavam a contagem dos gols pelo barulho dos fogos. Se ensurdecedor, a comemoração era do time da casa. Se discreto, a alegria era do clube visitante.
Que foguetório! Aquela fumaceira deixava tudo embaçado. Pena que alguns gaiatos mal sabiam manusear rojões e sofriam queimaduras. Estouros para baixo assustavam torcedores ao redor e abria-se um “clarão” na arquibancada. Algumas vítimas sofriam mutilações nos dedos, danos nos olhos e até surdez.
Bons tempos em que os jogadores só subiam aos gramados minutos antes das partidas, plenamente aquecidos nos vestiários. Depois, preparadores físicos importaram da Europa a metodologia de aquecê-los nos gramados, antes de se uniformizarem, e ficou sem graça a saudação posterior aos torcedores.
Naquela época, editores de jornais não priorizavam imagens em movimento. Publicavam foto posada do time da casa, restrita aos 11 jogadores e o massagista, posicionado sempre à esquerda, entre os agachados. E agachava-se literalmente, com a parte posterior da coxa encostada na panturrilha. Hoje, nem se pode dizer que a turma da frente fica agachada, já que sequer dobra o joelho.
Se nos estádios a rigorosa fiscalização sobre fogos inibe torcedores a burlarem a proibição, fora deles os abusos continuam. A maioria lembra do confronto entre vascaínos e corintianos em 2007, na capital paulista, resultando na morte de Clayton Ferreira de Souza, de 27 anos. E sabem quais as armas dos briguentos? Barra de ferro, faca e rojão.
Tal como aqui, na Alemanha torcedores usam rojões como arma, com Eintracht Frankfurt e Nuremberg multados em 50 e 25 euros, respectivamente. Pior na Áustria, porque o goleiro Georg Koch, do Rapud, perdeu parte da audição após ser atingido no ouvido por fogos de artifício. Por isso teve que abandonar a carreira.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Benê, injustiçado no futebol

Por Ariovaldo Izac

No futebol, em lances de bola parada, antes de algum atleta alçá-la para o interior da área, o que se vê é um agarra geral de jogadores, que mais parece uma luta livre. Tudo isso com complacência dos árbitros que, se aplicassem a regra, teriam de marcar pelo menos um pênalti a cada partida.
Esse futebol truculento de hoje contrasta visceralmente daquele praticado décadas passadas, quando atacantes e meias só recuavam até o limite do meio de campo para cercar adversários. E quando treinadores rigorosos exigiam marcação mais dura, a resposta era “não sei marcar”.
No final da década de 50 e durante os anos 60, o meia esquerda Benedito Leopoldo da Silva, o Benê, mostrava privilegiada visão de jogo. Sabia acionar os chamados ponteiros com bolas alongadas, como também cadenciava o jogo quando a circunstância era recomendável.
O início da carreira foi no Paulista de Jundiaí (SP). No Guarani, a partir de 1959, foi decisivo no título de um torneio triangular em Curitiba (PR), na goleada por 5 a 2 sobre a seleção paranaense e vitória por 1 a 0 diante do Botafogo (RJ) de Quarentinha, Garrincha, Didi e Manga.
Embora naquele período não havia descabida preocupação com condicionamento físico, Benê foi uma das exceções. O arranque era impressionante. Guardando-se as devidas proporções, há quem compare seu futebol ao do meia Rivaldo, hoje no Bunyodkor do Uzbequistão, com o diferencial de que Benê tinha mais velocidade.
Evidente que com as citadas virtudes teria de chegar à Seleção Brasileira. Eis que, após convocação para disputar a Copa do Mundo de 1962, foi cortado com o diagnóstico de sopro no coração, contestado por médicos do São Paulo. Assim, o técnico Aimoré Moreira chamou Mengálvio, do Santos, para ocupar a vaga.
O Brasil voltou do Chile com o bicampeonato mundial, e nem por isso Aimoré, que também dirigia o São Paulo, foi perdoado pelos cartolas. A demissão foi sintomática e Benê, contratado pelo Tricolor em 1961, continuou brilhando num período em que o departamento de futebol era relegado. Os recursos eram destinados às obras de ampliação do Estádio Cícero Pompeo de Toledo, o Morumbi.
Nos dez anos de São Paulo, Benê não se cansava de repetir o jogo do cai cai provocado pelo Santos, dia 15 de agosto de 1963. O Peixe se acovardou numa jornada de gala do Tricolor, que abriu vantagem de 3 a 1 no primeiro tempo, gols de Faustino, Benê, Sabino e Pelé. Contundido, o lateral Cido Jacaré não voltou para o segundo tempo. Como não era possível fazer substituições, o time santista ficou com dez jogadores.
Aí, por reclamações, o árbitro Armando Marques expulsou Pelé e Coutinho no início da etapa final. Em seguida, Pepe alegou contusão e saiu. Pagão marcou o quarto gol são-paulino aos sete minutos e, na sequência, Dorval também deixou o campo e o jogo acabou.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Vampeta, língua afiada

Imaginem se o ex-volante Vampeta tivesse aceitado o convite da Rede Record de Televisão para o confinamento no reality show “A Fazenda”. Com certeza aquela casa estaria de ponta cabeça. Sem dúvida, roubaria a cena como principal protagonista.

Claro que os participantes do reality show o interrogariam sobre a experiência de posar pelado para a revista G Maganize, destinada ao público gay, em 1999. O desbocado baiano, natural de Nazaré das Farinhas, teria de recapitular a origem do rótulo bambis para provocar são-paulinos; e explicar sobre a quebra de protocolo com cambalhotas na rampa do Palácio do Planalto, quando o então presidente Fernando Henrique Cardoso recepcionou a delegação do selecionado brasileiro após o pentacampeão mundial no Japão e Coréia do Sul em 2002; e a língua afiada causadora de frases imortalizadas no futebol.

A justificativa do apelido Vampeta ocorreu após a perda da primeira dentição. Para uns parecia um vampiro, para outros tinha jeito de capeta. Logo, associando-se prefixo de uma palavra ao sufixo de outra deu nisso. O nome Marcos André Batista Santos é lembrado só quando assina documentos, um deles o primeiro contrato profissional no Vitória da Bahia, em 1993. Na temporada seguinte, com 20 anos de idade, já era ídolo na Holanda jogando no PSV Eindhoven.

A partir daí transformou sua carreira num vaivém Brasil/Europa durante dez anos. Naquele período havia passado duas vezes pelo Corinthians, Fluminense, Paris Saint Germain (FRA), Inter de Milão (ITA), Flamengo e Al-Salmiya Club do Kuwait.

Até aí Vampeta escreveu bonita história no futebol, exceto a conturbada passagem pelo Flamengo em 2001, marcada por duas frases: “Eles fingem que me pagam, e eu finjo que jogo”, quando reclamava de salário atrasado. “A camisa do Flamengo não caiu bem em mim”, emendou.

Nos primeiros dez anos de carreira foi um volante moderno que conciliava força na marcação, velocidade na saída de bola para organizar os contra-ataques, e bom passe. Por isso integrou o grupo de jogadores brasileiros na Copa do Mundo de 2002.

A partir de 2005 começou a trilhar a penosa estrada da volta no futebol, e foi tri-rebaixado atuando por Vitória (BA), Brasiliense e Corinthians (terceira passagem). Também fez parte do elenco do Juventus que caiu para a segunda divisão paulista em 2008. Aí se mancou, pendurou as chuteiras profissionalmente, mas continua ligado ao futebol através da empresa Vamp Sport, que administra carreiras de atletas.

Quem supõe que é desmiolado, com base nas provocações gratuitas ao meia Sousas - hoje no Grêmio (RS) – se engana redondamente. Vampeta é dono de um bem montado restaurante no bairro Santana, na capital paulista, e designou seu pai para administrar sua fazenda em Nazaré das Farinhas, que produz abacaxi, manga, jaca e maracujá.

Ficou chato quando agrediu o goleiro Marcelo do Bahia, no começo deste ano, em Salvador (BA), só porque suspeitava que o ex-companheiro de Corinthians havia mantido relacionamento com sua ex-mulher.