terça-feira, 23 de setembro de 2008

Narciso, exemplo de superação

Vinte e sete de setembro é um dia especial para o ex-zagueiro Narciso, do Santos. Por se tratar do Dia Nacional do Doador de Órgãos, ele terá motivos de sobra para repetir sua heróica história de perseverança ao vencer a leucemia mielóide crônica.
A doença foi diagnosticada em 2000 e, na ocasião, os médicos projetaram que ele teria de 30% a 40% de chances de sobreviver. Ainda bem que erraram. O então zagueiro foi curado após um transplante de medula óssea e ainda voltou a jogar futebol profissionalmente no Peixe, três anos depois. E, por gratidão a benção recebida, promove jogos beneficentes para doação de alimentos à Nacac (Núcleo de Amparo a Crianças e Adultos com Câncer), Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) e Lar Santo Expedito, entidades de Santos.
O transplantado é monitorado pelo resto de sua vida, e isso implica em laço estreito com a equipe médica que o assistiu. Por isso, neste 27 de setembro, pacientes e doutores da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) participam de uma “pelada” de confraternização no pesqueiro do empresário de futebol Dalécio Pastor, em Campinas. Pastor é um transplantado de fígado e lamenta o preconceito do brasileiro para doação de órgãos. “Só 6% de nossa população aceita doar, contra 16% dos Estados Unidos e 36% da Espanha”, comparou o anfitrião, que convidou Narciso para o evento.
Evidente que qualquer transplantado fica mais debilitado e, conseqüentemente, exposto a enfermidades. No caso específico de Narciso, não foi especificamente o transplante que pesou na decisão de encerrar a carreira de jogador, em 2004. O fato de só esquentar o banco de reservas, com o treinador Vanderlei Luxemburgo, tirou-lhe a motivação. Em seis meses, após a cirurgia, jogou só cinco vezes.
Foi o Santos, também, quem lhe abriu as portas para ingressar na função de treinador, inicialmente como auxiliar do técnico Márcio Fernandes na categoria de juniores, e agora efetivado na função com a promoção de Fernandes à equipe principal.
Requisitado freqüentemente para palestras a pessoas vitimadas por doenças graves, Narciso narra sua história de superação e consegue estimular pacientes. Conta que jogou no Santos durante cinco anos, e que pendurou as chuteiras aos 31 anos de idade. Cita que, no auge da carreira, quis o destino que passasse por aquela provação, ocasião em que contou com a solidariedade da esposa Miradeide. Foi o período de sessões de quimioterapia até o transplante.
Como jogador, a história deste sergipano de Neópolis, nascido em dezembro de 1973, começou no Corinthians de Alagoas. A primeira experiência no futebol paulista foi no Paraguaçuense. Depois, transferiu-se para o Santos, passou rapidamente pelo Flamengo, por empréstimo, e, mais experiente, não estranhou adaptação à função de volante.
Narciso foi medalha de bronze com a seleção olímpica do Brasil em 1996, em Atlanta, nos Estados Unidos, e atuou oito vezes na seleção principal do País, entre 1995 e 1998. A mais gratificante experiência como jogador foi no time santista de 1995, vice-campeão brasileiro, formado por Edinho; Marquinho Capixaba, Ronaldo Marconato, Narciso e Marcos Adriano; Carlinhos, Giovanni, Robert e Jamelli; Camanducaia e Marcelo Passos. O Botafogo (RJ) foi campeão.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Boiadeiro, agora no pasto

Foi no grande Cruzeiro, do início da década de 90, que o meio-campista Marco Antônio Boiadeiro atingiu o auge da carreira. E a recompensa foi a convocação à Seleção Brasileira do técnico Carlos Alberto Parreira em 1993, para o Torneio US Cup nos EUA e Copa América no Equador. Boiadeiro atingiu a quinta partida no selecionado contra a Argentina jamais imaginando que o mundo desabaria sobre ele, na semifinal. É que na definição através de pênaltis, após empate em 1 a 1 no tempo normal, desperdiçou uma cobrança e o Brasil voltou para casa, enquanto a Argentina foi campeã com a vitória na final sobre o México, por 2 a 1.
Hoje, com 43 anos de idade, completados em 13 de junho passado, Boiadeiro conta essa e muitas outras histórias registradas nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais aos novos amigos de Monte Aprazível, cidade paulista onde está radicado, e faz uma das coisas que mais gosta: cuidar de gado. Ali tem tempo de sobra para soltar a voz em músicas sertanejas. Na década de 80, a dupla Chitãozinho e Xororó testemunhou seu ritmo afinado quando se conheceram em Campinas.
A rigor, o apelido de Boiadeiro se justifica porque no lombo de um cavalo conduzia a boiada com eficiência nos pastos de Américo Campos, cidade paulista onde nasceu. E usava traje a caráter: bota de fivela, chapéu, calça apertada e cinturão. Foi assim que apareceu no Estádio Santa Cruz, do Botafogo de Ribeirão Preto (SP), para participar de um treino peneira, e orgulha-se de ter sido o único aprovado de uma leva de 39 garotos, em meados da década de 80.
Começava ali uma trajetória vitoriosa. No time principal do Botafogo juntou-se aos também novatos Raí e Peu, e ao experiente Mário Sérgio, em 1985. No ano seguinte, participou da campanha do Guarani no Campeonato Brasileiro, com perda do título na decisão através dos pênaltis, contra o São Paulo, em Campinas, após empate em 3 a 3 no tempo normal e prorrogação. E quis o destino que Boiadeiro perdesse um dos pênaltis cobrados pelo time bugrino.
No Vasco, a partir de 1989, Boiadeiro comemorou em alto estilo o primeiro título da carreira, na vitória por 1 a 0 sobre o São Paulo, com gol de Sorato. O Vasco tinha um timão. Bebeto, que havia saído do Flamengo, juntou-se a Sorato, Boiadeiro, Luís Carlos Vinck, Mazinho e Bismarck, entre outros. Na ocasião, dos 71.552 pagantes, cerca de 25 mil eram vascaíno que invadiram o Estádio do Morumbi.
No Cruzeiro, desde 1991, Boiadeiro acostumou-se com títulos. Foi bicampeão da Supercopa da Libertadores da América 91/92 e campeão da Copa do Brasil em 93. No primeiro ano em Minas, sob o comando do técnico Ênio Andrade, já falecido, integrou o time formado por Paulo César Borges; Nonato, Paulão, Adilson Batista e Célio Gaúcho; Ademir, Marco Antônio Boiadeiro e Luiz Fernando (Macalé); Mário Tilico, Charles e Marquinhos. Na goleada por 3 a 0 sobre o River Plate, da Argentina, naquela final do dia 20 de novembro, o público no Estádio do Mineirão foi de 67.279 pagantes.
O desempenho no Cruzeiro refletiu em bons contratos no Flamengo, Corinthians e Atlético (MG), porém com rendimento aquém do esperado. E a fase decadente continuou no América (MG), Anápolis (GO), Rio Branco e União Barbarense, equipes do interior de São Paulo, até que em 2000 trocou a bola pela fazenda.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Lima, o coringa inigualável

Desde que você se entende por gente de certo já ouvia a frase de que “a torcida se constitui no 12º jogador”. Mas você sabe, também, que torcida não joga, não faz gols e às vezes até atrapalha quando vaia seu próprio time. O Santos da década de 60 pode dizer, sim, que teve um time de 12 jogadores. O Peixe contou com o melhor coringa do futebol brasileiro e quiçá do futebol mundial: Lima.
No Juventus, onde iniciou a carreira, Lima era volante, mas no Santos foi o reserva que sempre tinha lugar no time. Bastava qualquer titular se machucar para o técnico deslocá-lo na função. “Eu só não joguei de goleiro”, confessa esse sexagenário de cabelos grisalhos, barriga de chope e que se mantém ligado ao futebol coordenando uma escolinha para garotos, em Santos.
No Juventus, Lima um volante que desarmava sem abusar das faltas e tinha elegância na condução da bola. O Santos logo constatou essas virtudes e tratou de levá-lo à Vila Belmiro, em 1961.
Lima sequer havia passado perto de aeroporto e bastaram duas semanas no novo clube para conhecer a Itália, numa excursão do Santos. E as improvisações começam na lateral-direita, substituindo Getúlio. Depois, a experiência na lateral-esquerda. E como era um jogador forte na marcação, logicamente não estranhou as deslocações para o miolo de zaga.
Lima tinha facilidade para assimilar diferentes posições. “Bastava um treino no setor para me adaptar”, repetia sempre.
Evidente que não se poderia cobrar de Lima as atribuições de um ponteiro velocista, quando o improvisavam quer no lado direito, quer no lado esquerdo do ataque. Mas ele compensava com a facilidade para driblar e envolver adversários. E Lima tinha a vantagem de pegar bem na bola de média distância. Gols desse tipo lhes renderam moto-rádios e outros prêmios, determinados para o melhor jogador em campo.
Quando sequer cogitava-se polivalência para jogador de futebol, Lima era um dos raros exemplos de atleta completo. Era capaz de anular hábeis centroavantes nos tempos em que zagueiro não tinha a opção de jogar na sobra, quando a “treinadorzada” gritava, do banco, para cada zagueiro pegar um atacante.
Para justificar a fama de coringa, Lima era capaz, na mesma partida, de sair da zaga e se transformar em atacante perigoso. Por isso sempre arrumava um lugar no time, que tinha Gilmar; Getúlio, Mauro, Calvet e Dalmo; Zito e Mengálvio; Dorval, Coutinho, Pelé e Pepe.
E quando Zito pendurou as chuteiras, Lima foi fixado como volante, sabendo, todavia, que seria o primeiro reserva de quaisquer dos titulares.
A versatilidade encurtou o caminho à Seleção Brasileira, na Copa do Mundo de 1966, na Inglaterra. E depois do fiasco, sem “papas” na língua, criticou a falta de comando e julga ter sido esse o motivo para não ser relacionado à Copa do Mundo de 1970, no México, ocasião em que atravessava a melhor fase da carreira.
Em 1971, o coringa se transferiu para o Jalisco de Guadalajara, no México. Na seqüência, já no fim de carreira, voltou ao Brasil, defendendo o Fluminense.
Lima é concunhado de Pelé e, nos tempos de Santos, eram amigos inseparáveis. Ambos dividiam o mesmo quarto, quer em hotéis, quer nos alojamentos do clube.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Câncer derrota Moisés

Quando a mídia registrou a morte do zagueiro Moisés Matias de Andrade, no dia 26 de agosto, aos 60 anos de idade, enfatizou, de modo geral, que ele foi um zagueiro viril e às vezes violento. Reconheceu, também, que era um líder e atribuiu a causa da morte a um câncer no pulmão, sem detalhamento se a doença foi decorrente do tabaco ou não.
É sobejamente sabido que 90% dos casos de câncer no pulmão são desenvolvidos pelo tabagismo. Por sinal, o calendário comemorativo do ano apontou o dia 29 de agosto como o Dia Nacional de Combate ao Fumo. Na ocasião, os fumantes foram bombardeados com campanhas alertando sobre malefícios do cigarro, e nos surpreendemos positivamente com estudos que mostraram a redução pela metade do número de fumantes nos últimos 17 anos, apesar do aumento da população.
Quanto a Moisés, foi um carioca de Resende que “descia o sarrafo”. Procurava intimidar atacantes “matando” seguidamente as jogadas. Valia-se da tolerância dos árbitros que só mostravam o cartão amarelo após a advertência verbal.
Na época, dezenas de treinadores mandavam bater. “Rasga”, era a recomendação mais repetida para se tirar a bola da defesa de qualquer maneira, mesmo que acertassem a perna do adversário. Houve um período em que se dizia “bola ou bolim”, numa referência que passa a bola e não passa o adversário. Era a clara orientação para se matar a jogada no nascedouro.
Moisés - com passagens por Bonsucesso, Vasco, Corinthians, Fluminense, Flamengo, Bangu, Paris Saint-Germain, Belenense, Atlético (MG) e América (RJ) - teve a fama de xerife, mas raramente foi expulso. Consciente de suas limitações técnicas, se impunha pela raça. “Zagueiro que se preza não pode ganhar o Belfort Duarte”, repetia, referindo-se ao prêmio instituído pelo Conselho Nacional de Desportos em 1945, e entregue ao atleta que passava dez anos sem ser expulso de campo.
Uma virtude de Moisés reconhecida unanimemente era no jogo aéreo. Com 1,79m de altura, se incumbia de devolver de cabeça as bolas alçadas. Teve passagens com sucesso no Vasco e Corinthians. No time carioca foi campeão brasileiro em 1974 jogando ao lado de Andrada, Miguel, Alcir, Fidélis e Alfinete, entre outros. Um ano antes, atuou uma partida pela Seleção Brasileira. Foi no dia 21 de junho contra a União Soviética.
No Timão, de 1976 a 1978, integrou o inesquecível time que quebrou jejum de títulos de 22 anos, no dia 13 de outubro de 1977, com a vitória sobre a Macaca por 1 a 0, no terceiro jogo daquela final do Campeonato Paulista. Moisés teve a sorte de marcar o centroavante Rui Rei só por 16 minutos, devido à expulsão dele por ofensas morais ao árbitro Dulcídio Vanderlei Boschilia (já falecido). O time corintiano, comandado pelo técnico Oswaldo Brandão (já falecido), comemorou o título atuando com Tobias; Zé Maria, Moisés, Ademir Gonçalves e Wladimir; Ruço, Luciano e Basílio; Vaguinho, Geraldão e Romeu.
Como treinador, a única passagem destacada de Moisés foi no Bangu em 1985: vice-campeão brasileiro, perdendo a decisão para o Coritiba nos pênatis. Chegou a trabalhar nos Emirados Árabes.
Fora da bola, gostava da caça submarina e de Carnaval. Ajudou a criar o “Bloco dos Piranhas”, com jogadores desfilando vestidos de mulheres pelas ruas da zona norte do Rio de Janeiro.