segunda-feira, 29 de março de 2010

Zinho 'Enceradeira', um vencedor

Imagine uma conversa em família sobre histórias de Copa do Mundo de futebol e projete um pai detalhando as funções desempenhadas pelo meia Zinho ‘Enceradeira’, antigamente chamada de quarto homem de meio-de-campo, ocupando basicamente a faixa no lado esquerdo. O ‘velho’ dirá que Zinho participou da conquista do tetracampeonato nos Estados Unidos em 1994, exaltará seu bom passe, habilidade para prender a bola, lembrará dos golzinhos que fazia de vez em quando e da ajuda aos companheiros do setor, na marcação.

Aí o filho, com idade em torno de 10 anos, que naquela Copa sequer se acomodava à frente do televisor para ver futebol, pode questionar: o que é enceradeira? Calma. Não massacre o jovenzinho. Enceradeira é um aparelho em desuso. De certo é comercializada em pequena escala. Jamais se vê anúncios comerciais de lojas de eletro-doméstico propagando-a. Assim, a criança não é obrigada a reconhecê-la.

O piso dos compartimentos de uma casa popular é revestido de cerâmica, inclusive dormitório e sala, outrora enfeitados com madeira no formato de tacos e assoalhos. Aí, para lustrar o piso do ambiente, a tal enceradeira era indispensável. E o estilo de Zinho lembrava aquele disco giratório na maioria das jogadas. Rodava ao redor da bola sem progressão, e assim fazia jus ao apelido, que a princípio o incomodava.

Afora esse indesmentível defeito, Zinho associava virtudes que o credenciaram a jogar em grandes clubes, a começar pelo Flamengo em 1986. Lá atuou ao lado de Zico, Andrade, Leandro e Bebeto. Depois passou por Palmeiras (duas vezes), Yokahama Flugels do Japão, Grêmio, Cruzeiro, novamente Flamengo, Nova Iguaçu e Miami dos Estados Unidos, clube que abriu-lhes as portas para iniciar a carreira de treinador de futebol.

Digamos que Zinho sempre esteve no lugar certo, no momento certo. Por isso tem um histórico de colecionador de títulos no Brasileirão: Flamengo em 1992, bi pelo Palmeiras em 1993/94, no Grêmio em 2001 e Cruzeiro em 2003. Naquele timaço do Palmeiras de 1993, fez companhia para Edmundo, Edílson e Evair. A recompensa do trabalho foi convocação à Seleção Brasileira à Copa dos EUA, e na condição de titular absoluto.

Com essa biografia de vencedor e 57 partidas na Seleção, era natural que Zinho amarrasse bons contratos por mais alguns anos, e foi o que fez. A rigor, durante passagem pelo Grêmio - entre 2000 e 2002 - sonhou em retornar à Seleção para disputar a Copa no Japão e Coréia do Sul, principalmente após o corte do volante Emerson, por contusão. O sonho não se concretizou e ainda teve de cobrar na Justiça dívida de R$ 7,4 milhões do clube gaúcho. A negociação previa recebimento de 30% do valor no ato, e o restante em suaves prestações.

Hoje, perto de completar 43 anos de idade, Crizam Cesar de Oliveira Filho, o Zinho, pode viver tranquilamente dos rendimentos provenientes dos bons contratos feitos ao longo da carreira de atleta.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Tarciso, de boleiro a político

Parcela considerável dos jogadores de futebol tem vocabulário bem restrito. Ultimamente, observa-se abuso do verbo focar quando se quer expressar concentração total em determinada partida. “Nosso time tem que estar focado”. Eis aí uma frase decorada e repetida diuturnamente. Outra expressão odiada é “vamos erguer a cabeça e partir para a próxima”, quando se quer criar expectativa de reabilitação após derrota.
Como toda regra tem exceção, constata-se uma minoria de boleiros com vocabulário bem diversificado. Geralmente são aqueles que freqüentam bancos escolares de universidades, quem adquire hábito de leitura com bom conteúdo e, obviamente, os politizados, como é o caso do ex-atacante Tarciso do Grêmio, brizolista de carteirinha, que cumpre o primeiro mandato de vereador em Porto Alegre (RS).
Leitor da revista Veja e preparado para discussões dos principais problemas que afligem as comunidades, ele mostra facilidade de expressão, principalmente quando discursa sobre sua bandeira de campanha: projetos de inclusão social de crianças através do esporte. “Educação e esporte são caminhos para o desenvolvimento social”, costuma dizer, em conformidade com as idéias de Leonel Brizola, já falecido, cacique maior do PDT.
Sua Excelência José Tarciso de Souza foi eleito à Câmara de Vereadores de Porto Alegre em 2008, pelo PDT, com 6.232 votos. Constatou-se o resultado da perseverança para ingresso na carreira política, após postular, em vão, a cadeira no legislativo porto-alegrense em 2004. O peso do prestígio pelos 13 anos e 815 partidas pelo Grêmio foi decisivo.
No período de 1973 a 1986, jogando no tricolor gaúcho, Tarciso foi campeão da Libertadores da América em 1983, na final contra o Peñarol do Uruguai, no Estádio Olímpico, quando mais de 80 mil pessoas assistiram a vitória gremista por 2 a 1. Sagrou-se campeão mundial de clubes ainda naquele ano, no Japão, na vitória por 2 a 1 sobre o temível Hamburgo da Alemanha. Após empate em 1 a 1 no tempo normal, a vitória veio na prorrogação. Os gols foram marcados por Renato Gaúcho, num time comandado por Valdir Espinosa e formado por Mazaropi; Paulo Roberto, Baidek, Hugo de Leon e Paulo César Magalhães; China, Osvaldo (Bonamigo) e Mário Sérgio; Renato Gaúcho, Tarciso e Paulo César Caju (Caio).
As convincentes atuações levaram Tarciso à Seleção Brasileira, com histórico de oito partidas. Devido à velocidade ganhou o apelido de Flexa Negra, foi deslocado do comando do ataque à ponta-direita, e teve o nome na calçada da fama no Estádio Olímpico. Mineiro de São Geraldo, nascido no dia 15 de setembro de 1951, 1,77m de altura e 79 quilos, iniciou o repasse de clubes a partir de 1986: Goiás, Goiânia, Cerro Portenho do Paraguai e São José (RS) em 1990, onde encerrou a carreira de jogador iniciada no América (RJ). Tentou ser treinador no Cerro paraguaio, porém sem sucesso. Aí, transformou-se em instrutor de escolinha de futebol, com o diferencial que prestou serviço voluntário para crianças desassistidas.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Perdedores de pênaltis

Se o mundo parece ter desabado sobre a cabeça do atacante Dodô, do Vasco, após perder duas cobranças de pênaltis no jogo contra o Flamengo, neste 13 de março, serve de consolo saber que jogadores renomados também não escaparam desse martírio. Ou melhor: o argentino Martim Palermo foi além ao desperdiçar três penalidades em uma só partida, atuando pela seleção de seu país contra o Colômbia. Assim, entrou para o Guinnes Book, o livro dos recordes. O jogo foi válido pela Copa América de 1999, na Colômbia, e deveriam ter preservado esse goleador dessa situação inconveniente. Na primeira cobrança a bola chocou-se no travessão. Na segunda ele quase colocou a bola para fora do estádio. Por fim, a terceira cobrança mais parecia uma bola recuada ao goleiro adversário.

Dodô, o artilheiro dos gols bonitos, já sofreu com suspensão de 15 meses após flagrante de ingestão de substância proibida em exame antidoping. Depois, aos 36 anos de idade, imaginou trajetória de coisas boas, e ficou abatido com a desgraça no clássico carioca.

Como Dodô, o atacante Tuta, nos tempos de Fluminense, também perdeu dois pênaltis. Isso ocorreu no dia 17 de agosto de 1995, contra o Santos, quando o Flu ganhou por 2 a 1, pela Copa Sul-Americana, e Tuta marcou um dos gols.

Ainda naquela temporada, pelo Campeonato Carioca, Jean, do Vasco, também errou dois pênaltis em partida contra o Fluminense. Após empate em 1 a 1 no tempo normal, na decisão por pênaltis o vascaíno desperdiçou duas vezes, porque o árbitro Marcelo Venito optou pela repetição.

O consagrado ex-meia Raí, do São Paulo, perdeu dois pênaltis em jogo contra o Corinthians, nos tempos em que o Timão contava com o goleiro Dida. O jogo foi válido pela fase semifinal do Campeonato Brasileiro, em 1999, e o São Paulo permitiu que o rival avançasse à final.

Aquele ano também marcou o fim do casamento de Raí com Cristina Bellissimo. Ele com 17 e ela com 16 anos haviam se casado em Ribeirão Preto (SP) e tiveram duas filhas. A rigor, aos 33 anos de idade, Raí era um dos mais novos avôs do país, com o nascimento de Naíra, filha de Emanuela.

Naquele mesmo ano, foi a vez do ex-zagueiro Narciso, do Santos, ter de se explicar como pôde errar duas cobranças de pênaltis num jogo contra o América potiguar, em Natal, pela Copa do Brasil. O pior, para o então quarto zagueiro, estava reservado em janeiro de 2000, quando exames de rotina indicaram ser portador de leucemia mielóide crônica. Por causa disso teve de se submeter a um transplante de medula, com a irmã como doadora.

Após esforço sobrenatural, Narciso até voltou a jogar futebol, sem contudo recuperar o belo estágio atingido no próprio Santos. Assim, no dia 7 de junho de 2004 abandonou a carreira de jogador e se fixou como treinador da equipe de juniores do Peixe.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Kempes, astro argentino

Como já se respira clima de Copa do Mundo na África do Sul, é oportuno que se mergulhe nas histórias desse principal evento do futebol. E voltando-se ao ano de 1978, constata-se que o primeiro título mundial conquistado pela Argentina ainda é coberto de dúvida, principalmente pela classificação obtida à segunda fase da competição. Os platinos precisavam conquistar vitória por quatro gols de diferença sobre o Peru e foram além: golearam por 6 a 0, com falhas incríveis do goleiro Quiroga, coincidentemente um argentino naturalizado peruano.
Foi a última Copa com 16 participantes. Na primeira fase, a Argentina perdeu para a Itália por 1 a 0. A compensação foi ter vencido Hungria e França - ambos por 2 a 1 - o que resultou na classificação à segunda fase com a segunda vaga no grupo.
Restaram oito países na competição, divididos em dois grupos de quatro. Aí, o regulamento previa que os melhores de cada grupo decidissem o título e deu Argentina. Na 2ª fase, enquanto o Brasil empatou com os donos da casa sem gols e venceu Polônia e Peru, respectivamente por 3 a 1 e 3 a 0, os platinos passaram pela Polônia por 2 a 0 e aplicaram suspeita goleada por 6 a 0 nos peruanos.
Moral da história: mesmo eliminado da competição, o técnico do selecionado brasileiro, Cláudio Coutinho, alardeou que sua equipe havia sido campeã moral. Já os argentinos, revigorados com a robusta vantagem sobre o Peru, foram à finalíssima e venceram a Holanda por 3 a 1. Se no tempo normal foi registrado empate em 1 a 1, sobrou vitalidade na prorrogação com a marcação de mais dois gols.
O time base da Argentina, comandado por Cesar Luiz Menotti, foi de Fillol; Olguin, Galván, Passarela e Tarantini; Gallego, Ardiles e Luque; Kempes, Bertoni e Ortiz. Na explosão pela conquista do primeiro título mundial, os argentinos endeusaram o atacante Mário Kempes, responsável por seis gols de seu selecionado na competição. Foi o bastante para que se redimisse da participação discreta no selecionado da Argentina no Mundial de 1974, na Alemanha, quando não fez um gol sequer. E se dele muito se esperava na competição de 1982, na Espanha, ficou devendo novamente, sem marcar gols.
O grato torcedor argentino preferiu se mirar nas brilhantes atuações de Kempes na inédita conquista em seu país, e comprou centenas de bonecos em forma de miniatura de seu ídolo. O cabeludo unia velocidade e oportunismo. Por isso, agora como comentarista de futebol de televisão de seu país, tem opinião de peso e projeta a Espanha como favorita ao título na África do Sul, embora não descarte Brasil, Alemanha e Argentina.
Kempes ainda tem relação com o futebol espanhol. Ainda como atleta, atuou no Valência nos anos 70 e 80. Só parou de jogar em 1992 no Fernandez Vial, clube do Chile. Na Argentina, jogou no Córdoba, Rosário Central e River Plate.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Margarida e seus trejeitos

Em mil novecentos e bolinha alguém disse que futebol é feito para homem, e a partir daí a “zagueirada” se considerou no direito de dar botinadas continuamente e ainda repetir esse preconceituoso bordão. Com a introdução do cartão amarelo, a partir da Copa do Mundo de 1970, jogadores violentos começaram a perder espaço no futebol devido ao rigor da arbitragem. Assim, o condenável conceito de bater da medalhinha pra cima caducou.

Certamente essa propagação de que “futebol é feito para homem” retardou a consolidação do futebol feminino no Brasil. Hoje, com caneleiras protetoras, elas podem dividir bola sem o temível receio de marcas nas pernas, outrora provocadas por travas de chuteiras adversárias. Assim, mantém a feminilidade e elegância.

Talvez essa conceituação ditatorial de que “futebol é feito para homem” resulta em comportamento discretíssimo de homossexuais que compartilham da modalidade. Afinal, você conhece algum jogador de futebol profissional que tenha afirmado publicamente a sua homossexualidade? Que existe, existe. Geralmente esses casos são camuflados por motivos óbvios. É difícil surgiu um corajoso como o britânico Justian Fashanu, considerado o primeiro jogador de futebol no profissionalismo a assumir publicamente a sua homossexualidade. Isso ocorreu na Inglaterra em 1990, mas a carreira só se prolongou por mais oito anos. Ele foi denunciado de abuso sexual a um menor de idade e teve de se afastar do meio.

No amadorismo o tabu já foi quebrado em 2007 com a realização da 1ª Copa do Mundo de Futebol Gays e Lésbicas disputada em Buenos Aires, na Argentina, com participação de 14 países, sem a inclusão do Brasil.

Técnicos gays também estão espalhados por aí. O quebra-cabeça é identificá-los, porque não são assumidos.

A rigor, gay assumido, mesmo, foi o árbitro carioca Jorge Emiliano dos Santos, o Margarida, que completaria 56 anos de idade neste 3 de março, se fosse vivo. Paciente aidético, morreu aos 41 anos de idade, no dia 21 de janeiro de 1995.

Margarida integrou o quadro de árbitros da Federação de Futebol do Rio de Janeiro, e estreou apitando no Estádio da Gávea, na vitória do Flamengo sobre o Volta Redonda por 3 a 1 em 1988.

Tecnicamente era até considerado um bom árbitro. O problema era o marketing pessoal. O desmedido desejo de aparecer mais que os artistas do evento, os jogadores, era notório com seus trejeitos e a forma como desmunhecava na aplicação de cartões amarelos. Por isso ingressou no bloco dos folclóricos.

Quando apitava jogos do ex-atacante e hoje treinador Renato Gaúcho, pelo Campeonato Carioca, sempre arrumava um jeito de mostrar-lhe cartão amarelo. E fazia de uma forma carinhosa.

Hoje, podem ser identificados imitadores de Margarida espalhados pelo Brasil, um deles o catarinense Clésio Moreira dos Santos, de Palhaça, região metropolitana de Florianópolis. Esse ex-árbitro fez questão de usar uniforme cor-de-rosa e trejeitos acrobáticos. Como diferencial, é casado e pai três vezes.