segunda-feira, 28 de julho de 2014

Hélio Maffia, que baita preparador físico!

 Hoje, a realidade do futebol atribui ao treinador responsabilidade total sobre desempenho de seus comandados, e exatamente por isso é ele quem monta a comissão técnica do clube que dirige, trazendo profissionais de sua estreita confiança. Esta constatação contrasta com décadas passadas quando o preparador físico desenvolvia um trabalho paralelo e não se submetia ao crivo do treinador que, quando demitido, simplesmente dava lugar a outro profissional do setor, preservando-se o restante da equipe.
 Assim foi a maior parte da trajetória do preparador físico Hélio José Maffia nos tempos de Palmeiras, São Paulo, Guarani e Corinthians. A rigor, a participação dele em comissões técnicas transcendia o trabalho de educador da parte física. Pode-se dizer que acumulava a função de supervisor ao exigir pontualidade dos atletas para horários de treinos, viagens, café da manhã e refeições em hotéis, assim como exigia que se vestissem de forma condizente.
 Certa ocasião, na passagem pelo Guarani entre o final dos anos 70 e meados da década de 80, Maffia flagrou o então lateral-esquerdo Miranda se apresentando para a concentração com uma bermuda vermelha e imediatamente exigiu que ele vestisse calça.
 Cozinheiras dos clubes em que o professor trabalhava não se atreviam a preparar refeições sem que o cardápio fosse especificado. E esta exigência de controle disciplinar no Guarani era apoiada por líderes de grupo como o zagueiro Gomes e o goleiro Neneca, que tinham plena ascendência sobre companheiros do elenco.
 Maffia foi um profissional com inteira independência para agendar os dias de treinos físicos. Também aplicava exercícios sem o uso de cordas e desconsiderava programações em que o atleta corria sobre degraus de arquibancadas. Nas semanas longas de trabalho, após a folga às segundas-feiras, as terças eram bem puxadas e começavam com o velho modelo de o jogador correr ao redor do gramado, ocasião em que era avaliado sobre o real condicionamento. Foi um período em que atletas com uns gramas a mais acusados na balança, decorrente dos excessos, eram submetidos a sequências de abdominais que pareciam intermináveis. Quando necessário, não dispensava a boa conversa ao pé do ouvido, um conceito pedagógico que acreditava.
 Na passagem pelo Corinthians, Maffia chegou a ser treinador interino por aproximadamente seis meses, entre 1984-85, sempre deixando claro que não tinha intenção em dar prosseguimento na função.

 Agora, aos 82 anos de idade completados no dia 21 de julho, Maffia goza de merecida aposentadoria, sem que isso implique em distância do esporte, tanto que participa ativamente de entidades ligadas ao meio em sua cidade natal de Jundiaí (SP), onde nunca deixou de residir durante o período em que estava na ativa.

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Adeus ao polêmico árbitro Armando Marques

 Ex-árbitros de futebol de muita popularidade geralmente arrumam empregos de comentarista de arbitragem em rádio e televisão. Armando Nunes Castanheira da Rosa Marques, morto no Rio de Janeiro no dia 17 de julho de insuficiência renal, aos 84 anos de idade, foi além. Ganhou um programa de variedades na extinta Rede Manchete de Televisão em 1993, num esquema de rodízio entre apresentadores: o Show da Manchete. Ele o apresentava às segundas-feiras, e nos outros dias Otávio Mesquita, Ivon Curi, Monique Evan e Rosana Hermman se alternavam no comando.
 Armando Marques foi um comunicador por excelência. Apesar da fragilidade física, a velocidade de raciocínio ainda pôde ser manifestada no dia 21 de abril passado, quando entrevistado pelo eclético Jô Soares na TV Globo, ocasião em que revelou nunca ter medo na vida. “Eu agradeço a Deus porque ele me privou do sentimento do medo”.
 O ex-árbitro integrou a equipe de comunicadores da TV Manchete no período em que ela havia investido maciçamente no jornalismo, teledramaturgia, esportes e entretenimento, e por isso incomodava a Rede Globo de Televisão. O jornal da emissora, apresentado pelo casal Eliakim Araújo e Leila Cordeiro, tinha uma hora de duração. O programa Documento Especial era a marca do jornalismo investigativo. Atores consagrados como Maitê Proença e Gracindo Júnior alavancaram a audiência da novela ‘Dona Beija’, mas o pico no Ibope foi alcançado por Pantanal. Clodovil Hernandes, Xuxa e Angélica participaram da grade da programação.
 Como árbitro, tecnicamente Armando Marques foi tido como um dos melhores nas décadas 60 e 70, apesar de erros crassos na carreira. Santos e Portuguesa dividiram o título do Campeonato Paulista de 1973, porque na definição através de cobranças de pênaltis o time santista vencia por 2 a 0, o árbitro deu a partida por encerrada com a Lusa ainda tendo chances vencer, e assim restou à Federação Paulista de Futebol premiar os dois clubes.
 Na decisão do Paulistão de 1971 ele anulou gol de cabeça legítimo de Leivinha, do Palmeiras, contra o São Paulo, interpretando que o atacante tivesse usado a mão. O erro foi determinante para que o adversário ficasse com o título da competição.
 Num período em que atletas eram identificados predominantemente pelos apelidos, Armando Marques os chamavam pelo nome. Pelé, por exemplo, era senhor Edson, que ele ousou expulsar num jogo contra o São Paulo em 1963.
 Embora educado, Armando Marques repreendia os atletas energicamente para manter a disciplina. Tinha o hábito de adverti-los com dedo em riste no rosto, e por isso levou um soco do lateral-esquerdo Nilton Santos, já falecido.

 Por causa dos trejeitos nos gramados, o público nos estádios, predominantemente conservador, entoava o coro de ‘bicha’. Seja como for, o certo é que ele morreu solteiro.

Adeus a Di Stéfano, o melhor antes de Pelé


 A natural concentração do noticiário esportivo sobre Copa do Mundo engoliu a repercussão da morte do argentino naturalizado espanhol Alfredo Di Stéfano neste 4 de julho, aos 88 anos de idade, proveniente de problemas cardíacos. A história mostra que antes da aparição de Pelé - indiscutivelmente o melhor jogador de futebol do planeta -, todas as honras do topo se concentravam em Di Stéfano.
 Paradoxalmente, este gênio do futebol não disputou uma Copa do Mundo sequer. Quando defendia o River Plate da Argentina, a partir de 1945, participou do Sul-Americano de Clubes de 1948, ocasião em que marcou quatro gols. Um ano depois o futebol argentino enfrentou uma greve de jogadores que reivindicavam melhores condições de trabalho, porque a pauta elaborada de negociações foi negada. Disso se aproveitou o clube Milionários da Colômbia para levá-lo, acenando com boa proposta financeira e sem necessidade de pagamento do passe, visto que a liga colombiana era amadora e não havia como a Fifa intervir.
 Lá, Di Stéfano participou de 292 partidas e marcou 267 gols. Logo, chegou ao selecionado da Colômbia, onde ficou conhecido como ‘a flecha loira’. Por isso despertou interesse dos rivais espanhóis Barcelona e Real Madrid, que se digladiaram para contratá-lo. E naquele impasse surgiu uma proposta alternativa para que ambos se revezassem na vinculação do jogador a cada ano durante um quadriênio. Houve discordância do Barcelona e assim Di Stéfano se transferiu ao Real a partir de 1953.
 Velocidade, habilidade e gols aos montes consagraram este ponta-de-lança já naturalizado espanhol, que não se constrangia com a fama de ‘fominha’, com a justificativa de que “o goleador tem mesmo é que ser egoísta”. Só que a Espanha não se classificou à Copa do Mundo da Suécia de 1958, e assim ele aguardou quatro anos para a competição no Chile, jamais contando que fosse se lesionar às véspera do embarque, o que provocou o corte da delegação.
 Assim, restou continuar brilhando no Real Madrid até 1966, quando pendurou as chuteiras, sem contudo sair do meio. Optou por morar na Espanha e lá foi treinador de clubes e até presidente honorário do Real. E entre as muitas histórias que gostava de contar, Di Stáfano ressaltava que mesmo integrando o time do River Plate teve que serviu ao Exército argentino simultaneamente à carreira de atleta, obrigatoriedade da época tanto lá como cá.
 Talvez seja de desconhecimento da maioria que Pelé, mesmo após ter sido campeão mundial em 1958, um ano depois foi o soldado Nascimento do Grupo Motorizado da Costa da Praia Grande, do Exército brasileiro, conciliando a atividade de profissional do Santos F.C. E isso se repetia aos montes com jogadores brasileiros, que tinham naturais regalias de liberação para participação nos chamados treinos aprontos e dias de jogos.


segunda-feira, 7 de julho de 2014

Assis perambulou dez anos até ser reconhecido

 Na atualidade, jogador que se destacar em quaisquer das divisões de campeonatos de seu estado logo será contratado por agremiações de maior porte, principalmente as das capitais de grande centro. Esta situação contrasta com décadas passadas quando ‘revelações’ permaneciam por mais tempo em seus clubes interioranos, e um claro exemplo disso foi o centroavante Careca, que durante cinco temporadas - a partir de 1978 - defendeu o Guarani, transferindo-se posteriormente ao São Paulo.
 Naquele período os clubes sobreviviam basicamente de bilheterias e não havia o abismo financeiro entre grandes e médios do futebol brasileiro. Apesar disso, é difícil explicar como um jogador com o talento do atacante Assis, falecido neste dia seis de julho, ficou perambulando por clubes do interior paulista durante oito anos até se transferir ao São Paulo em 1980.
 Benedito de Assis Silva se profissionalizou na Francana em 1972 e no ano seguinte transferiu-se para o São José, onde ficou durante quatro anos. Após passagem pela Internacional de Limeira em 1977, voltou à Francana. E em 1979 participou do time que pela primeira vez disputou aquele inchado Campeonato Brasileiro com 90 clubes, cuja formação era de Geninho; Gaspar, Poli, Zé Mauro e Cláudio; Pavan, Paranhos e Antenor; Marinho, Assis e Delém. O goleiro Geninho hoje é treinador.
 No São Paulo, mal Assis formou dupla de ataque com Serginho Chulapa já perdeu a vaga para Renato ‘Pé Mucho’, que veio do Guarani. No pouco tempo que atuou por lá participou deste time: Valdir Peres; Antenor, Nei, Bezerra e Airton; Teodoro, Ailton Lira e Assis; Paulo César, Serginho Chulapa e Zé Sérgio.
 Posteriormente, a passagem relâmpago no Inter (RS) nem conta. A carreira dele decolou mesmo no Atlético Paranaense em 1982, quando ratificou a postura de jogador envolvente com a bola nos pés, boa visão como assistente de goleador, assim como também sabia fazer gols com bola no chão ou no alto. Lá ele formou a histórica dupla de ataque com Washington, batizada na época de ‘Casal 20’, alusão a um seriado de TV criado pelo romancista Sidney Sheldon. E ambos ajudaram o ‘Furacão’ a quebrar jejum de título estadual de 12 anos numa equipe formada por Roberto; Ariovaldo, Jair, Bianchi e Jorge Luís; Sérgio, Lino e Nivaldo; Capitão, Washington e Assis.
 Aquilo que era bom ficou melhor com a transferência da dupla para o Fluminense em 1983, que ajudou a quebrar a hegemonia do Flamengo no campeonato estadual, com vitória por 1 a 0 sobre o rival na final, e o gol do título marcado por Assis aos 45 minutos do segundo tempo. Eis o time: Paulo Vitor; Aldo, Duílio, Ricardo Gomes e Branco; Jandir, Delei e Leomir; Assis, Washington e Paulinho. E lá Assis ficou até as pernas pesarem em 1987. Depois jogou futebol profissional até 1990, encerrando a carreira no Paysandu.

Como montar a Seleção Brasileira desde 1958?

 Em tempos de Copa do Mundo, que tal se projetar um combinado de atletas brasileiros que já participaram desta competição desde 1958, e que não precisam necessariamente ter sido os melhores da posição?
 Taffarel, campeão mundial nos Estados Unidos em 1994, obrigatoriamente é o goleiro. Afinal, foi participante de três Mundiais consecutivos a partir de 1990, tem histórico de brilhantes passagens por Inter (RS) e Galo mineiro, encerrou a carreira no Parma da Itália em 2003, e agora atua como preparador de goleiros no Galatasary da Turquia.
 Convenhamos que Leandro, que fez carreira apenas no Flamengo, se encaixa bem na lateral-direita. Em 1986, às vésperas da viagem dos brasileiros à Copa do México, foi solidário ao companheiro Renato Gaúcho, cortado por indisciplina, e pediu dispensa do grupo.
 Evidente que uma dupla de zaga formada por Luiz Pereira e Ricardo Rocha provocaria raríssimas objeções. Luizão ganhou notoriedade no Palmeiras e Seleção Brasileira em 1974, antes de se transferir ao Atlético de Madrid, da Espanha. E ao encerrar a carreira nos anos 80, aos 43 anos de idade, voltou à Espanha e atualmente trabalha como diretor da equipe B do mesmo Atlético. Ricardo Rocha teve brilhantes passagens por Guarani, São Paulo e Fluminense e Seleção Brasileira.
 Escalem Júnior na lateral-esquerda, porque tecnicamente superou os falecidos Nilton Santos e Marinho Chagas. A ótima visão de jogo como comentarista da TV Globo ele já mostrava nos gramados, nos tempos de Flamengo e Seleção Brasileira.
 Igualmente não dá pra colocar restrições num trio de meio de campo formado por Clodoaldo, Rivellino e Pelé. Exceto Clodoaldo, aposentado em Santos, os outros continuam ligados ao futebol. Rivellino atua como comentarista da TV Cultura de São Paulo, enquanto Pelé divulga o futebol brasileiro nos continentes, continua requisitado como ‘garoto propaganda’, e se mantém no ramo empresarial.
 Claro que as honrarias no ataque ficam para a trio formado por Ronaldo Fenômeno e Romário, ambos com carreiras bem sucedidas quando penduraram as chuteiras, e o falecido ponteiro-direito Mané Garrincha. Ronaldo agencia jogadores de futebol e soube se infiltrar com sucesso no marketing. Romário enveredou para a carreira política e no final de 2014 vai completar o primeiro mandato parlamentar de deputado federal.
 Treinador do selecionado brasileiro?  Paradoxalmente o escolhido não conquistou título, mas montou uma das melhores equipes na Copa do Mundo de 1982. Trata-se do também falecido Telê Santana.
 E jogadores como Mauro Ramos de Oliveira, Nilton Santos, Marinho Chagas, Falcão, Zico, Reinaldo, Carlos Alberto Torres, Tostão e Jairzinho ainda ficaram de fora.


Oberdan só morreu aos 95 anos de idade

Desconfiem das pessoas que mecanicamente divulgam profundo pesar pela morte de outra de 95 anos de idade. Pois foram constatadas várias manifestações deste tipo por ocasião da morte do lendário goleiro Oberdan Catani, do Palmeiras, no dia 20 de junho passado.
 Conforme antigo bordão, ninguém fica para semente. O caminho natural de uma pessoa quase secular é a morte e não seria diferente com Oberdan, que estava internado no Hospital do Servidor Público da cidade de São Paulo. Restou, todavia, uma história de um palestrino que em 1942 viu o então presidente da República do Brasil, Getúlio Vargas, exigir que o antigo Palestra trocasse de nome para Palmeiras, porque nosso país e Itália estiveram em lados opostos por ocasião da Segunda Guerra Mundial.
 Oberdan Catani foi absoluto na meta do Palmeiras de 1941 a 1954, período em que o distintivo do Palmeiras era caracterizado por um P (maiúsculo). Elasticidade e boa colocação eram tidas como as principais virtudes dele, que a conduziram à Seleção Brasileira. Assim, participou do Sul-Americano de países de 1945 ao lado de renomados jogadores como os meias Zizinho e Jair da Rosa Pinto, o zagueiro Domingos da Guia e o centroavante Ademir de Menezes, o Queixada. E o Brasil foi vice-campeão daquela competição, atrás da Argentina.
 Oberdan foi reverência no Palmeiras, embora antigos conselheiros tenham torcido o nariz pelo fato dele ter encerrado a carreira no Juventus. Assim, o então goleiro procurava se defender justificando que foi obrigado a procurar outro clube porque o consideraram velho entre os palmeirenses.
 Ele abriu a história de quatro inesquecíveis goleiros do Palmeiras. Em 1958 chegou ao clube o gaúcho Valdir Joaquim de Moraes, igualmente com virtudes de boa colocação e elasticidade. Não fosse isso jamais sobreviria no futebol com apenas 1,70m de altura, estatura jamais permitida para a posição na atualidade. Valdir, que jogou no Palmeiras até 1969, participou da era ‘Academia do Futebol’ entre 1964 e 1966, numa defesa formada por Valdir; Djalma Santos, Djalma Dias, Valdemar Carabina e Ferrari. E quando encerrou a carreira de jogador criou a função de preparador de goleiros no próprio Palmeiras, nos anos 70.
 A história de bons goleiros do Palmeiras teve sequência com a chegada de Emerson Leão no final dos anos 60. A regularidade o levou à Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1970 e foi titular absoluto nas Copas de 1974 e 1978.
 Depois dele, o Palmeiras contou com Marcos Roberto Silveira Reis, o ovacionado Marcos, que saiu da Lençoense para brilhar no Parque Antártica a partir de 1992.
 Marcos tem uma história singular ligada ao Palmeiras. Em 2003 recebeu proposta milionária do Arsenal da Inglaterra, mas preferiu continuar no clube e para defendê-lo na disputa da Série B do Campeonato Brasileiro.