segunda-feira, 29 de abril de 2013


Dêner, uma história curta

 

 A Portuguesa de Desportos não fez mais do que a sua obrigação ao garantir novamente o acesso ao Campeonato Paulista da Série A1 do ano que vem. A instabilidade do clube contrasta com período em que revelava jogadores e fazia campanhas no mínimo razoáveis.

 Um dos astros renomados da Lusa foi José Lázaro Nobles, o Pinga, maior artilheiro da história do clube com 190 gols. Em 1952, após oito anos ininterruptos no clube, Pinga foi brilhar no Vasco, ocasião em que a empresa Gillette o requisitou como garoto-propaganda para um comercial sobre lâmina de barbear. Ele morreu no dia 7 de maio de 1996.
 Outros meias e atacantes notáveis passaram pela Portuguesa, como Servilio, Ivair, Leivinha, Cabinho, Enéas e o paulistano Dêner Augusto de Souza, titular entre 1991 a 1993, e autor de gol histórico contra a Inter de Limeira (SP) pelo Campeonato Paulista de 1992, quando driblou toda defesa adversária a partir do meio-de-campo, concluindo a jogada com um "totozinho" na bola.


 Dener, franzino e de canelas finas, surgiu nas categorias de base da Lusa em 1991, e houve quem prognosticasse o surgimento de um novo príncipe no Canindé. Naquele mesmo ano foi conduzido ao time principal e chamado pelo então técnico Paulo Roberto Falcão à Seleção Brasileira.

 Rápido como lambari, deixava a ‘zagueirada’ estonteante com as suas arrancadas. Aplicava até o drible da vaca quando julgava conveniente, e sempre marcava os seus golzinhos.
 De repente o menino humilde coloca a mão num dinheiro jamais visto e a ‘mulherada’ fica assanhada. Foi quando faltou estrutura psicológica para administrar a fama e os cartolas da Lusa projetaram recuperá-lo emprestando o passe ao Grêmio, em 1993.


 A segunda chance de recuperação foi no Vasco em 1994, igualmente por empréstimo. Quis o destino que Dêner morresse aos 23 anos de idade, vítima de acidente de automóvel no dia 19 de abril daquele ano, na Avenida Borges de Medeiros, que margeia a Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro. Ele viajava de São Paulo ao Rio de automóvel, em companhia do amigo Oto Gomes de Miranda, que dirigia o Mitsubishi branco e dormiu no volante, perdeu a direção, e o carro se chocou contra uma árvore. Conseqüência: ele perdeu as duas pernas.

 Naquele momento, Dêner repousava no banco do carona, reclinado, e o pescoço foi prensado no cinto de segurança, provocando estrangulamento. O laudo médico apontou asfixia e fratura cervical.
 Dener foi alvo de polêmica entre Portuguesa e Vasco após a morte. É que o clube cruzmaltino não havia feito seguro de US$ 3 milhões - valor do passe - e o caso tramitou na Justiça, até que o Vasco foi intimado a pagar.
 Na véspera da morte, dirigentes da Lusa haviam definido a transferência do jogador para o Stuttgar, da Alemanha, mas a Europa não pôde se deliciar com o talento dele.

segunda-feira, 22 de abril de 2013


Dulcídio, árbitro respeitado


 Nos confrontos decisivos da Ponte Preta contra o Corinthians geralmente a mídia recorda a terceira partida da final do Campeonato Paulista de 1977, quando a arbitragem de Dulcídio Vanderley Boschilia foi contestadíssima pela expulsão do atacante Rui Rei, do time de Campinas, aos 16 minutos do 1º tempo, no Estádio do Morumbi, com a justificativa de que foi xingado pelo jogador.
 Dulcídio, que morreu no dia 14 de maio de 1998, aos 60 anos de idade, vítima de câncer, ficou marcado como árbitro de pavio curtíssimo, intolerante à violência e indisciplina, porém correto. E quem suspeitou que tivesse tirado proveito da arbitragem se equivocou. Morreu pobre.
 Constas no currículo dele ter apitado a vitória da Seleção Brasileira sobre o Equador por 1 a 0 em 1989, no Estádio José Fragelli, no Mato Grosso, em amistoso. A carreira dele foi marcada por fatos curiosos, um deles em 1983, quando interrompeu a partida entre Atlético (PR) e Campo Grande (RJ), aos 43 minutos do 1º tempo, por causa de inesperada dor de barriga. Por isso deu um pique até o vestiário e, minutos depois, já aliviado, subiu ao gramado sob aplausos dos torcedores para reiniciar o jogo.
 Dulcídio foi investigador de polícia e, nos freqüentes diálogos com os jogadores, avisava que sabia tudo da escola de malandragem, que ninguém iria ludibriá-lo. Na maleta de viagem, além do uniforme levava obrigatoriamente um revólver, e de vez em quando o usava preventivamente com disparos para o alto, para assustar cartolas atrevidos que pretendiam intimidá-lo.
 Há relatos na imprensa de São José do Rio Preto (SP) de que Dulcídio colocou gente da diretoria do América para correr no velho Estádio Mário Alves de Mendonça, do América, quando houve tentativa de invasão em seu vestiário, na década de 80.
 Naquele período, enquanto Dulcídio fazia a turma ‘dar no pé’, a maioria da ‘juizada’ afinava com intimidações de clubes mandantes no futebol paulista.
 Em 1970, Laudo Natel, governador biônico do Estado de São Paulo, imposto pela ditadura militar, acumulava cargo de presidente do São Paulo e sentava no banco de reservas nas partidas de seu time. Ele chegava de helicóptero e a sua presença era intimidatória à arbitragem. Posteriormente o São Paulo usou seguranças truculentos, que intimidaram o árbitro gaúcho Bráulio Zannoto com covarde agressão em 1981, durante jogo da semifinal do Campeonato Brasileiro, contra o Botafogo do Rio, no Estádio do Morumbi. O time carioca precisava só do empate, ganhava por 2 a 0, mas perdeu por 3 a 2 e foi eliminado.
 Seguranças, escondidos no vestiário e distantes de policiais, esmurraram e chutaram o tornozelo de Zannoto no intervalo. Assim, ele mancou visivelmente durante o 2º tempo. Um dos bandeirinhas também foi agredido e o outro, mais esperto, escapou dos covardes agressores.


segunda-feira, 15 de abril de 2013


Grapete, zagueiro que nunca marcou gols


 Nas décadas de 60 e 70 era raro zagueiros marcarem gols. A ‘treinazorzada’ restringia passagens deles do meio-de-campo até em cobranças de escanteios. Ditão, do Corinthians, - já falecido - só ganhava permissão para se projetar à área adversária e tentar gols de cabeça nos cinco minutos finais. E se o placar fosse adverso à sua equipe.

Um dos exemplos de zagueiro que jogou futebol profissionalmente 1963 a 1976 e não marcou um gol sequer foi o do mineiro de Silvianópolis Jorge Borges de Couto, que em maio completa 70 anos de idade, apelidado de Grapete, que coincidentemente jogou futebol em apenas uma agremiação: Clube Atlético Mineiro. E só parou por causa de lesão no joelho.

 Aí, anos depois, ele ingressou com ação na Justiça requerendo auxílio-acidente e conseguiu provar, com base em perícia, seqüelas originárias da atividade como jogador de futebol. Assim, passou a receber mensalmente do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) o benefício auxílio-acidente.

  O estilo era de zagueiro vigoroso que sabia usar o corpo para evitar desvantagem nas tentativas de penetrações de atacantes, e assim foi campeão do primeiro Campeonato Brasileiro na temporada de 1971, ocasião em que Telê Santana - já falecido - era o treinador, num time formado por Renato; Humberto Monteiro, Grapete, Vantuir e Oldair; Vanderlei Paiva e Humberto; Ronaldo, Lola, Dario e Tião.

 Naquele ano a competição foi disputada por 20 clubes de oito Estados, dividida em dois grupos de dez equipes em cada. Assim, os seis primeiros colocados de cada grupo passaram à segunda fase, com redistribuição em três grupos de quatro clubes em cada um. Atlético Mineiro, São Paulo e Botafogo, vencedores nas respectivas chaves, participaram do triangular e o Galo ganhou dos adversários por 1 a 0.

  Grapete participou da inauguração do Mineirão em setembro de 1965, atuando pelo combinado do Estado de Minas Gerais que venceu o River Plate da Argentina por 1 a 0. Na época, se convencionava dizer o nome real do estádio, que homenageava Magalhães Pinto, homem de trajetória vencedora. De escriturário do Banco Hipotecário e Agrícola do Estado de Minas Gerais foi promovido a diretor em três anos. Também foi fundador da UDN (União Democrática Nacional) e signatário do Ato Institucional nº 5, o mais repressivo no período da ditadura militar.

 Por que Grapete?  Porque o seu pai foi distribuidor do refrigerante lançado no Brasil em 1948, o primeiro com sabor de uva e framboesa, cujo slogan era ‘quem bebe Grapete repete’. A marca competia com os refrigerantes Coca-Cola, Pepsi-Cola, Crush, Gini, Cerejinha e os guaranás da Antártica e da Brahma.

 Certa ocasião, locutores da Rádio Continental do Rio de Janeiro, patrocinada pela Brahma, transmitindo jogo do Galo, não o chamavam de Grapete. Identificavam-no como guaraná, por causa da concorrência.

segunda-feira, 8 de abril de 2013


Dezessete anos sem Telê Santana

 
 Este 21 de abril será lembrado como o 17º ano da morte do treinador Telê Santana que, diferentemente de comandantes por aí, pautava pela orientação de jogo limpo e no ataque, em busca de gols. Ele sequer se importava com retrancas montadas por equipes adversárias. Certa ocasião, instigado a criticá-las, surpreendeu na resposta: "Se o adversário fica lá atrás, meu time tem o domínio do jogo, cria mais chances e basta ter competência para marcar e ganhar".

 Nos tempos de São Paulo, contra adversários retrancados, Telê exigia que os seus laterais chegassem ao fundo do campo e cruzassem para trás. Como não tinha cabeceador em sua equipe, trabalhou para que o meia Raí desempenhasse bem a função.

 Telê jamais prescindiu de dribladores e de um exímio cobrador de faltas. No lógico raciocínio, time que ataca e que conta com individualidades naturalmente terá faltas favoráveis nas imediações da área adversária. Aí, um exímio cobrador faz a diferença. Pois Raí também foi treinado para ser ‘o cara’.

 E quando se elogia o desenho tático do Barcelona da Espanha por prescindir do centroavante nato, tem-se que ressaltar que há duas décadas Telê já colocava o seu time em campo sem esse atacante de referência. Optava pelo meia Palhinha como homem de chegada.

 Telê jamais abandonou a ousadia de buscar o gol, mesmo que o preço de uma defesa aberta tenha custado a eliminação da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1982, na Espanha. Sua equipe precisava apenas de um empate diante da Itália, mas perdeu por 3 a 2. Na década de 90 os seus conceitos foram recompensados ao sagrar-se bicampeão mundial como treinador do São Paulo.

 Depois de cinco magníficos anos na função, no Tricolor do Morumbi, teve de abandonar aquilo que era mais sagrado em sua vida: trabalhar no futebol.  Complicações cardíacas o deixaram debilitado desde 1995, com feição apagada e sensação de angústia, pois não aceitava a distância dos gramados, de gritar com seus jogadores e resmungar com juízes. Ali sentia a emoção típica do futebol.

 A esperança de driblar a doença e voltar ao trabalho havia sido descartada pelos médicos. Por isso restava-lhe distrair em atividades agropecuárias no seu sítio em Belo Horizonte, ou defronte à televisão acompanhando futebol, novelas e programas de auditório.

 Como jogador, vestiu a camisa sete do Fluminense exercendo dupla função: de posse da bola fazia jogadas de fundo de campo, mas sem ela recuava no meio-de-campo para fechar os espaços do adversário.

 No final da década de 50 aportou em Campinas e jogou no Guarani ao lado de Dimas e Osvaldo ‘ponte aérea’ (ambos falecidos), Cabrita e Eraldo, entre outros. Na ocasião justificou o apelido de ‘mão de vaca’. Morava na casa do então técnico Elba de Pádua Lima, o Tim (falecido), comia e bebia e não desembolsava um tostão sequer.

 

segunda-feira, 1 de abril de 2013



Maurício, nome inesquecível no Botafogo

  

 Lembra-se de Maurício, aquele ponteiro-direito que fez história no Botafogo do Rio de Janeiro na década de 80? Provavelmente não. E se for acrescentada a informação de que ele marcou o gol do título do Campeonato Carioca de 1989, quando foi quebrado um jejum de títulos de 21 anos?

 Claro que botafoguenses e flamenguistas, protagonistas daquela final, bem se lembram dele naquela vitória do ‘Fogão’ por 1 a 0, gol marcado aos 12 minutos do segundo tempo, no Estádio do Maracanã.

 O saudoso Telê Santana era treinador do Flamengo, num time em que jogavam ‘cobras’ como Jorginho, Aldair, Leonardo, Renato, Zico, Bebeto e Zinho. Os campeões botafoguenses foram Ricardo Cruz; Josimar, Wilson Gottardo, Mauro Galvão e Marquinhos; Vitor, Carlos Alberto Santos e Luisinho; Maurício, Paulinho Criciúma e Gustavo (Mazolinha).

 Aquele time do Botafogo era comandado pelo treinador Valdir Espinosa, hoje comentarista da Rádio Globo do Rio de Janeiro e crítico ácido da Seleção Brasileira. “Para exigir um bom futebol de nosso selecionado, temos que olhar primeiro para o modelo que está sendo efetivado em nossos times. As fracas atuações na maioria das equipes do Brasil reflete nos resultados da Seleção Brasileira”, escreveu em seu blog pessoal.

 Esta inquietação de Espinosa remete à lógica pergunta: com a pobreza do futebol brasileiro de hoje, alguém com a característica hábil e veloz de Maurício teria camisa na Seleção Brasileira?

 Nos tempos dos ‘cobras’, com concorrência mais acirrada entre atacantes na Seleção Brasileira, Maurício jogou uma vez e participou muito mais em selecionado olímpico e de juniores.

 Maurício de Oliveira Anastácio, 50 anos de idade completados em setembro passado, fechava em diagonal e concluía jogadas. De vez em quando também fazia uns golzinhos de cabeça ao explorar a estatura de 1,84m de altura, numa história que começou a ser construída no Bonsucesso do Rio de Janeiro, período em que não havia o abismo financeiro entre clubes grandes e médios.

 Nos anos 80, um atleta com carreira ascendente como Maurício saía do pomposo Inter gaúcho e se transferia naturalmente para o América (RJ), clube que hoje integra a segunda divisão do futebol do Estado do Rio de Janeiro. Como imaginar hoje um atleta recém saído do Celta da Espanha para transferência à Portuguesa? Pois isso aconteceu com Maurício em 1991.

 A cobiça do futebol asiático resultou em passagens pelo Ulsan Hyndai da Coréia do Sul e All Star do Japão, antes de percorrer a estrada da volta na carreira no XV de Piracicaba e Londrina. Sabiamente aplicou parte daquilo que ganhou em uma corretora de imóveis e leva uma vida sólida no Rio de Janeiro. E continua no meio como empresário de futebol e em projeto social de escolinha para garotos. O diferencial é o cabelo: antes encarapinhado e hoje cacheado com mecha.