domingo, 31 de julho de 2016

Washington, 411 gols em 17 anos de carreira

 Estão espalhados por aí, aos montes, os tais ex-jogadores em atividades, que relutam enquanto podem à ‘aposentadoria’, com conivência de incautos cartolas. A lisura do então atacante Washington ‘Coração Valente’ não permitiu que fosse usurpador de clube. Aos 35 anos de idade, até podia jogar mais um pouco sem abrupta queda de rendimento, até porque diagnósticos de saúde davam-lhe plena garantia. Todavia, teve percepção que o momento era de parar. Assim, o torcedor ficou com a última impressão dele como emérito goleador.
 Em 13 de agosto de 2011 Washington sentiu outra dor no peito. Foi a dor de despedida da carreira de atleta na sede do Fluminense, seu último clube na carreira. E o discurso foi cortado algumas vezes pelas lágrimas. “É um momento difícil demais. Infelizmente um dia a nossa profissão acaba”, confessou, sem prever que deixava claro recado a colegas que teimam em jogar, em vez de curtir a vida.
 O brasiliense Washington Stecanela Cerqueira saiu de cena com a biografia de quem entrou para o Guinnes Book (livro dos recordes) como maior artilheiro entre as edições do Campeonato Brasileiro, ao assinalar 34 gols em 2004, no Atlético Paranaense, clube que abriu-lhe as portas para que desafiasse a medicina e voltasse a jogar futebol após complicações cardíacas.
 Ano anterior, no Fenerbahçe da Turquia, Washington sentiu ardência no peito durante treino, e testes ergométricos mostraram anomalia no batimento cardíaco, o que evidenciou risco de enfarte. Logo, se submeteu a cirurgia angioplástica para desobstrução de artérias coronárias, praticamente entupidas pelo colesterol. Houve implante de minúscula válvula para o sangue voltar a funcionar.
 E que sangue! E que coração valente anexado ao nome no meio futebolístico! Foram 411 gols em 17 anos de carreira. Gols repartindo a bola com a becaiada, ou chutando de média distância indistintamente com quaisquer das pernas, embora seja destro. E gols de cabeça ao explorar a estatura de 1,89m de altura.
 Washington nasceu no dia da mentira - um primeiro de abril de 1975 -, mas sempre foi verdadeiro e destemido. O diabetes diagnosticado ainda no Caxias em 1996, seu primeiro clube, não foi empecilho. Se Grêmio e Inter (RS) mal avaliaram sua condição técnica em passagens por empréstimo, a Ponte Preta saboreou 83 gols marcados por ele em 106 jogos em duas passagens pelo clube.
 Afora os 14 meses afastado do futebol para cuidar da saúde, ele completou trajetória em Atlético Paranaense, São Paulo e Fluminense. No tricolor paulistano foram 45 gols em 86 jogos.
 Claro que ao se desligar do futebol aquele coração valente estava preparado para novas emoções. Em 2012 foi eleito vereador por Caxias do Sul com 7.979 votos, 3,37% daquele cartório eleitoral. Na cidade também é construtor de imóveis.

domingo, 24 de julho de 2016

Doze anos sem o treinador Zé Duarte

De fato a seleção feminina de futebol do Brasil parece cometa. Surge de vez em quando, principalmente em eventos relevantes como os Jogos Olímpicos, com calendário de jogos na primeira fase de três a oito de agosto contra China, Suécia e África do Sul, respectivamente.

 Impossível fazer referência à seleção feminina de futebol sem citação do saudoso treinador Zé Duarte. Se a modalidade havia sido criada antes dele, tem-se que necessariamente observar que ele a recriou em termos competitivos no país. Foi ele quem pacientemente ensinou o bê-á-bá para as meninas, e aquele trabalho promissor rendeu como fruto o quarto lugar na Olimpíada de Atlanta (EUA) em 1996.

 Qual o segredo para a transformação de uma modalidade recreativa para competitiva? Ao assumir o desafio um ano antes, Zé Duarte nada mais fez de que ensinar fundamentos para as meninas. Elas ganharam força muscular para que chutinhos se transformassem em chutes aceitáveis. Repetiu à exaustão domínio de bola, passe e cabeceio. E, como segundo passo, ajustou posicionamento delas em campo, de forma que a maioria não corresse desordenadamente atrás da bola, coisas típicas de quem treina equipe infantil masculina, como fez Zé Duarte no começo de carreira, na década de 60, no Guarani e Ponte Preta, quando deixou o ofício de encanador.

 Em 1966, no juvenil da Ponte Preta, lapidou o meia Dicá e lateral-direito Nelsinho Baptista, entre outros. E na primeira experiência com os profissionais, apostou na molecada e reconduziu o clube à divisão principal do Campeonato Paulista, após nove anos de fracasso na divisão inferior.

 Portanto, neste 23 de julho que marcou o 12º ano da morte do treinador campineiro, cabe recapitular os vices campeonatos paulista pela Ponte Preta em 1977 e 79, e ressaltar que levou o Guarani à semifinal do Campeonato Brasileiro de 1982, quando administrava com habilidade noitadas às sextas-feiras do também saudoso meia Jorge Mendonça.

 Zé Duarte o escondia no Departamento Médico durante o treino recreativo nas manhãs de sábado, mas impunha condição que desequilibrasse no jogo do domingo.

 Ao constatar o seu ex-atleta em situação degradante, apoiado em balcão de bar, Zé Duarte se irritou: “O Jorge gosta de todo mundo. Só não aprendeu gostar dele mesmo”.

 O gerenciamento do dia a dia de Zé Duarte nos clubes que dirigia ia além de conceitos técnicos e táticos. Era um paizão, e às vezes até tolerantes, com atletas indisciplinados e temperamentais, optando pelo aconselhamento. Todavia não deixava o grupo descambar com abusos da noite.

 Aí, sabiamente planificava obrigatoriedade de apresentação no clube às 7h para o café da manhã, sem se importar com ociosidade até ás 9h, quando começava a etapa de treinamentos. E após treino e banho da tarde, a boleirada tinha que esperar o jantar servido no clube por volta das 18h30. “Com o bucho cheio eles (jogadores) evitam sair à noite pra beber”, era a estratégia.

 Zé Duarte tinha olho clínico na indicação de reforços. Raramente errava e assim fazia boas campanhas por onde passava e ainda dava lucro aos clubes com vendas de passes de jogadores.


 Se não vingou no Cruzeiro, Fluminense e Internacional, teve passagens marcantes no Bahia e Atlético Paranaense. Nada comparado a vaivém nos clubes campineiros, quando usava um chapéu que ganhou da família Cury, em Campinas.

domingo, 17 de julho de 2016

Adeus ao polivalente Ferrari

 Até pouco tempo Gilberto José Ferrari era administrador da Praça de Esportes Olímpio Dias Porto, no bairro Cidade Jardim em Campinas, interior de São Paulo. Era um chefe mandão e, às vezes, até malcriado com boleiros do futebol amador que fugiam das normas para uso do campo de futebol.
 Claro que a maioria dos usuários daquela praça não se deu conta que aquele senhor calvo e de rosto enrugado fez parte da Academia do Palmeiras nos anos 60, atuando como lateral-esquerdo numa defesa que tinha Valdir; Djalma Santos, Djalma Dias, Waldemar Carabina e Ferrari.

 Pois esse Ferrari de uma história bonita no futebol morreu neste 15 de julho em Campinas, aos 79 anos de idade. Uma história que o palmeirense menos avisado custou a entender em 1963, quando o seu clube contratou um lateral destro para jogar como lateral-esquerdo, em substituição a Geraldo Scotto, que havia sofrido fratura na perna.

 Quando o Palmeiras havia sondado o interesse por Ferrari, já sabia nos mínimos detalhes a trajetória dele pelo Guarani. Verificou o lançamento na equipe principal justamente num dérbi campineiro em fevereiro de 1959, na vitória sobre a Porte Preta por 3 a 2, com gol dele logo aos dois minutos.

 Embora fumante de um maço por dia, Ferrari tinha fôlego, e era um ponta-direita rápido. Nem por isso foi fixado como titular, e alternou algumas improvisações na ponta-esquerda, sem que estranhasse mudança de lado.

 A característica de jogador combativo fez com que o treinador do Guarani de 1960, Armando Renganeschi, o adaptasse à lateral-direita, e ali foi titular absoluto até o final da temporada de 1962.

 Logo, a facilidade para que Ferrari se enquadrasse a quaisquer dos lados do campo levou os cartolas do Palmeiras a projetarem que se encaixaria bem no time na lateral-esquerda, e posteriormente levasse vantagem na disputa da posição com Geraldo Scotto e Vicente Arenari.

 No Palmeiras, apelidado de Bruxa, Ferrari colecionou os títulos paulistas de 1963 e 66, Rio-São Paulo de 1965, e dois anos depois comemorações no Torneio Roberto Gomes Pedrosa e Taça do Brasil. E sempre pautando pela firmeza na marcação e bom passe no apoio ao ataque.

 O vínculo dele com o Palmeiras foi rompido em 1969, totalizando 293 partidas. Ele e o atacante Servílio foram dispensados pelo então treinador Ernesto Filpo Nuñes, fato que provocou o retorno do atleta ao Guarani, e passagens posteriores por Comercial de Ribeirão Preto e Paulista de Jundiaí.

 Depois disso Ferrari se transformou em metalúrgico da empresa Roberto Bosch, em Campinas, e por fim o emprego público na Prefeitura de Campinas.

segunda-feira, 11 de julho de 2016

Nunes, atacante goleador e sarrista

 Nos tempos áureos do Flamengo, na década de 80, certa ocasião o atacante Nunes foi assediado por um exército de repórteres, sua boca ficou entupida de microfones, e, na costumeira espontaneidade, ele lançou essa ‘pérola’: “Fiz que fui, não fui, e acabei fondo”. Tudo isso para descrever lance de gol que levou a galera do ‘Mengão’ ao delírio, no Estádio do Maracanã.
 No jogo de despedida do meia Zico do Mengão, Nunes chutou o ‘velho balde’ quando iniciava comparação dentro e fora de campo: “Tanto na minha vida futebolística quanto na minha vida ‘ser humana’...”.
 Assim era João Batista de Oliveira, o baiano de Feira de Santana apelidado de João Danado, que no quesito improvisação e alegria nada ficava devendo ao jogador João Pinto, que atuava no Clube do Porto. Certa ocasião, o português nos ‘brindou’ com essa reflexão: “O meu clube estava à beira do precipício, mas tomava a decisão correta. Deu um passo à frente”. 
 O divertido João Danado ‘colocou no bolso’ o também atacante Claudiomiro, do Internacional (RS), quer na bola, quer nas ironias. O então roliço atacante gaúcho confundiu alho com bugalho e trocou o Oriente Médio pelo Estado do Pará quando a delegação do time colorado chegou a Belém (PA) para disputar partida contra o Paysandu, pelo Campeonato Brasileiro de 1972: “Tenho o maior orgulho de jogar na terra onde Cristo nasceu”.
 No campo, Claudiomiro e Nunes tinham estilo semelhante. Jogavam enfiados na área adversária para completar jogadas. O diferencial de Nunes é que sabia aproveitar melhor as oportunidades de gols. Repartia as jogadas com zagueiros e levava vantagem em muitas delas quer no chão, quer no alto.
 A rigor, a estatística fala mais que as palavras. Em 212 jogos pelo Flamengo marcou 96 gols, no período de 1980 a 1987. Antes disso, fez sucesso no Fluminense, e principalmente nos três anos de Santa Cruz (PE), quando foi bicampeão estadual. Foi um período em que ele mostrou faro de gol e a recompensa sintomática foi convocação à Copa do Mundo da Argentina, de 1978. Era a grande chance dele se consagrar em um Mundial, mas uma contusão provocou o corte às vésperas da competição.
 A carreira do atacante - dispensado pelo próprio Flamengo nas categorias de base - se arrastou até 1992, no Santa Cruz, após passagens ainda por Botafogo (RJ), Náutico (PE), Boavista de Portugal, Volta Redonda (RJ), e pelo futebol da China e El Salvador. E quando parou de jogar, Nunes fixou residência no Rio de Janeiro em luxuoso apartamento de São Conrado. Só que a partir daí começou a torrar dinheiro e bens. Consequência: teve que se mudar para modesta casa em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense.
 Contabiliza-se, como desperdício de dinheiro, uma aventura no mundo musical. Foi um erro apostar na carreira de pagodeiro, com lançamento de dois discos, mas Nunes não quer remoer o passado.

 O Flamengo criou a função de preparador de atacantes para Nunes, na década passada, a fim de que ele ensinasse aos discípulos os segredos para enfrentar goleiros. Todavia, como não prosperou na função, preferiu arriscar a carreira de treinador, com passagem pelo futebol amazonense, porém sem emplacar como comandante de grupo. Nunes completou 62 anos de idade em maio passado.

segunda-feira, 4 de julho de 2016

Apelidos para boleiros agora é coisa rara

 Ditão, Toquinho, Pepe, Lico, Pio, Lê e Dé foram jogadores devidamente identificados pelos apelidos no passado, quando não havia frescura para que fossem chamados pelo nome de registro de nascimento em cartório. Hoje, são raros os boleiros que permitem identificação que não seja o nome verdadeiro. Alguns até fazem exigência de nomes compostos, na vã expectativa de que o tolo apego ao marketing lhes renderão bons frutos.
 Ronaldo Francisco Lucato é nome usado em documentos oficiais e formalidades pelo ex-atacante Lê, que fez sucesso no São Paulo nos anos 80. Não questionem qual a ligação do monossílabo Lê com o nome. O que importou para o torcedor são-paulino, com a transferência do atacante Careca para o Nápoli da Itália, era que o time precisava de um substituto que não estivesse num plano muito inferior. Por isso o então treinador Pepe fez a indicação em 1987, com base no rendimento do atleta na temporada anterior, quando ambos comemoraram o título paulista na Inter de Limeira.
 Lê, que em setembro completa 52 anos de idade, foi um ágil condutor de bola e, consequentemente, difícil de ser marcado. Ele jogou ainda no Santa Cruz (PE) e Portuguesa, sempre com a versatilidade que possibilitou aos treinadores escalá-lo em diferentes posições do ataque. Na Inter só foi efetivado na equipe improvisado como ponteiro-esquerdo. Logo, por ser destro, não estranhou também o deslocamento à antiga ponta-direita, até no São Paulo.
 Convenhamos que o apelido Dé não é recomendável a qualquer jogador, mas isso não foi obstáculo para que Domingos Elias Alves Pedro marcasse história no futebol carioca. No Bangu, onde desabrochou para o futebol, foi chamado apenas por Dé. No Botafogo e Vasco passaram a chamá-lo de Dé Aranha.
 Dé, que em abril passado completou 68 anos de idade, foi aquele meia-direita à moda antiga que partia com bola dominada sobre o marcador, com ambição de fintá-lo. Assim, cansou de abastecer o centroavante Roberto Dinamite nos tempos de Vasco, fato que lhe deu bagagem quando migrou à função de treinador e na atuação como comentarista de futebol em rádio e televisão do Rio de Janeiro.
Dé Aranha jogou ainda no Bonsucesso e Rio Branco do Espírito Santo. Como treinador, de 1985 a 2011m passou por equipes cariocas como América, Botafogo e Vaso.
 Mais discreto foi o Dé lateral-esquerdo que se transferiu da Portuguesa Santista ao Palmeiras décadas passadas. Ele atuou num período em que jogador que se destacava fora da capital paulista era cobiçado e contratado.
 Por fim, o que leva as pessoas a colocarem apelido em alguém de Pio? Foi assim que Osmar Alberto Volpe ficou conhecido nos tempos de Ferroviária de Araraquara, tricampeão do interior paulista de 1967 a 1969, atuando num quinteto ofensivo formado por Passarinho, Leocádio, Téia, Bazani e Pio.

 Incontinente, Pio se transferiu ao Palmeiras, e se caracterizou como cobrador de faltas, além das jogadas em velocidade pela ponta-esquerda. Isso se prolongou até 1972, quando o Verdão foi buscar igualmente em Araraquara outro jogador da posição, com vantagem de mais agilidade no drible: Elias Ferreira Sobrinho, ou simplesmente Nei, que ganhou a posição. Sem espaço no Palmeiras, Pio tentou um recomeço da Portuguesa, mas já não tinha as mesmas credencias.