segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Cabralzinho, melhor lá fora

O futebol transformou o ex-treinador Carlos Roberto Ferreira Cabral, o Cabralzinho, em poliglota. Se o mercado brasileiro não lhe foi generoso em oportunidades, lá fora escancararam-lhe as portas, principalmente na Ásia e África. Se por aqui cartolas santistas sequer renovaram o seu contrato após o vice-campeonato brasileiro de 1995, na tumultuada decisão contra o Botafogo (RJ), na Tunísia foi ovacionado ao levar o Esperance a conquista da copa daquele país, onde retornou em 2009. Ele também fez bonito no Egito ao comandar o Zamalek no biênio 2004-2005. De certo faz essas reflexões ao completar 66 anos de idade neste 2 de janeiro de 2011.

A rigor, 1995 foi o melhor ano de Cabralzinho como treinador no Brasil. Não fosse a catastrófica arbitragem do mineiro Márcio Rezende de Freitas, constaria em seu currículo o título do Campeonato Brasileiro. Naquele jogo, no Estádio do Maracanã, foi anulado um gol legítimo do Santos, através do ponteiro Camanducaia. Paradoxalmente o árbitro validou um gol impedido do então botafoguense Túlio. O Santos jogou com Edinho; Marquinho Capixaba, Ronaldo, Narciso e Marcos Adriano; Carlinhos, Marcelo Passos e Robert (Macedo); Jamelli, Giovanni e Camanducaia.

Aquela foi a segunda passagem de Cabralzinho como técnico do Santos. A primeira vez foi em 1991. A última dez anos depois, ao regressar da Arábia Saudita, do Al Qasisiyah. E por ter cravado seu nome na região do Golfo Pérsico, Rayan e Al Shamal do Catar também o contrataram, além de treinar a seleção juvenil daquele país. No Brasil Cabralzinho comandou Atlético (PR), Figueirense, Goiás, Portuguesa Santista, Mogi Mirim, São Bento e São José, os quatro últimos do interior paulista.

Antes disso foi boleiro, e dos bons. Se nos primeiros anos de Santos ficou na reserva de Pelé e Coutinho, seu futebol habilidoso apareceu no São Bento de Sorocaba (SP). Na sequência, discreta passagem pelo Fluminense e encantou naquele inesquecível Bangu de 1966, que conquistou o título estadual perseguido há 33 anos. O time, comandado por Alfredo Gonzáles, chegou aos 3 a 0 com três minutos do 2º tempo, calando a maioria de flamenguistas daqueles 140 mil pagantes no Maracanã. Vinte e dois minutos depois, o banguense Ladeira catimbou em cima do lateral-esquerdo adversário, Paulo Henrique, fato que resultou em pancadaria, com expulsões de cinco jogadores do Flamengo e quatro do Bangu. O jogo foi encerrado e Ladeira levado a hospital, após chute na cabeça desferido por Almir Pernambuquinho, assassinado sete anos depois em porta de bar de Copacabana, no Rio.

O Bangu tinha Ubirajara; Fidélis, Mário Tito, Luís Alberto e Ari Clemente; Jaime e Ocimar; Paulo Borges, Ladeira, Cabralzinho e Aladim. Cabralzinho ainda jogou no Flamengo e Palmeiras.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Maldito Alzheimer

Dezembro é mês de luz, fraternidade, reflexão e retrospectiva. E quem tem memória razoável logo vai lembrar que o maldito Alzheimer castigou e originou mortes de três ex-jogadores, ou melhor, três ex-zagueiros em 2010: Ramos Delgado, Waldemar Carabina e Francisco Sarno. O ano ainda foi marcado pelas mortes de mais dois ex-boleiros famosos: o polivalente Urubatão Calvo Nunes e o atacante Washington, ex-Guarani e Corinthians.

O Mal de Alzheimer varre a memória das pessoas. Na maioria das vezes o drama começa com a procura de um objeto mantido no lugar costumeiro. Remédio é apenas paliativo para retardar o agravamento da doença.

O argentino Ramos Delgado, que morreu no dia 3 de dezembro aos 75 anos de idade, deixou uma história de cinco anos na Vila Belmiro. Foi entre as décadas de 60 e 70, como absoluto da camisa três do Santos. Também fez parte daquela geração o vigoroso palmeirense Waldemar Carabina, que morreu na noite do dia 22 de agosto, aos 78 anos de idade. Carabina gabou-se de ter anulado Pelé em algumas partidas: "Poucos o marcaram tão bem quanto eu".

Da turma da bola, Sarno foi a primeira vítima do ano das complicações do Mal de Alzheimer. Morreu em 17 de janeiro na capital paulista, aos 86 anos de idade, com biografia de zagueiro clássico, treinador supersticioso e ousadia para escrever o livro “A Dança do Diabo”, que revela desmandos no futebol dentro e fora dos gramados. Como atleta passou por clubes como Botafogo (RJ), Vasco, Palmeiras e Santos. Como treinador comandou Corinthians, Coritiba, Atlético (PR), Guarani e Ponte Preta. No Guarani, em meados da década de 60, tinha o hábito de carregar uma toalha durante os jogos, e a usava para indicar o canto que o goleiro de seu time deveria arriscar em cobranças de pênaltis para o adversário, colocando-a na mão direita ou esquerda. E se o goleiro contrariasse sua instrução seria sacado do time.

Urubatão Calvo Nunes, natural do Rio de Janeiro, não foi um jogador de futebol acima da média nos tempos do grande Santos das décadas de 50 e 60, quer na zaga, quer no meio-de-campo. Também foi um treinador apenas razoável e morreu no dia 24 de setembro, aos 79 anos de idade, vencido por um tumor cerebral e outro no pulmão.

Quanto a Washington Luiz de Paula, morreu aos 57 anos de idade no dia 15 de fevereiro, em decorrência de complicação renal. No ápice da carreira integrou a seleção brasileira juvenil no Torneio de Cannes, na França, e disputou a Olimpíada de Munique, na Alemanha, em 1972. Naquele período sua gingada era fantástica. Balançava o tronco magrelo de um lado e saía com a bola no sentido oposto. Por isso alguns apressados o projetaram como sucessor de Pelé, apesar do meia preferir a assistência ao companheiro de ataque a finalizações, ignorando a importância de se pontuar entre os artilheiros.



terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Viola, carreira polêmica

A enxurrada de gols marcados nos anos 90 refletiu em bons contratos salariais para o ex-atacante Viola durante uma década após a virada do século. Os gols rarearam, as coreografias caíram no esquecimento, e nem por isso os cartolas deixaram de apostar nele como atração de bilheteria.

A polêmica carreira de Viola indica uma sequência de capítulos, um deles sobre a origem do apelido. Se nos tempos de ‘terrão’ – famoso campo de futebol da capital paulista – era identificado pelo nome de registro, Paulo Sérgio Rosa, bastou se apresentar às categorias de base do Corinthians com um par de chuteiras da marca Viola para ganhar o apelido. A marca superava a concorrente Gaeta, uma botina de bico duro que, desgastada pelo tempo, machucava pés de atletas com pregos que se soltavam na sola, obrigando sapateiros a entortá-los. Quanta diferença para a levíssima chuteira F50 adiZero da Adidas, que pesa 165g; ou a V1.10 Lightning da Puma, com peso de 150g!

Quis o destino que em 1988, aos 19 anos de idade, Viola substituísse o atacante Edmar na segunda partida da final do Corinthians contra o Guarani, pelo Campeonato Paulista, em Campinas, e marcasse o gol do título na prorrogação. E depois que saiu do anonimato caiu em desgraça com 105 dias sem balançar as redes. Por isso foi emprestado ao São José e Olímpia, equipes do interior paulista.

A volta triunfal ao time corintiano deu-se em 1993 como artilheiro do Paulistão com 20 gols, cada um comemorado com nova coreografia. A mais ousada delas foi documentada na primeira partida daquela final, na vitória sobre o Palmeiras por 1 a 0, quando imitou um porco chafurdando. O Palmeiras venceu o segundo confronto por 3 a 0 no tempo normal e 1 a 0 na prorrogação, resultado que deu-lhe o título.

Viola integrou o grupo de jogadores brasileiros tetracampeões na Copa do Mundo dos Estados Unidos em 1994, época que havia se transferido ao Valencia da Espanha. Destemido, topou o desafio de jogar no Palmeiras em 1995, apesar do alto índice de rejeição dos torcedores, e por motivos óbvios.

Gols e títulos do Paulistão e Copa do Brasil calaram os críticos. E tudo ia bem até 1999, já como atleta do Vasco, quando sagrou-se campeão do Torneio Rio-São Paulo. Depois a fonte secou. Santos, Gaziontepspar da Turquia, Flamengo, Juventus (SP), Guarani, Uberlândia, Duque de Caixas, Rezende (RJ) e Brusque (SC) quase não usufruíram de seus gols na carreira encerrada na metade da temporada de 2010.

Viola já havia se despedido do futebol profissional em 2009 para ingressar no showbol, quando agrediu o árbitro Nilton José Romeiro com uma cabeçada após contestar a marcação de uma falta, num jogo do Corinthians contra o Botafogo (RJ). Depois voltou ao profissionalismo.

Sua última aparição foi através do really show ‘A Fazenda’ da TV Record, quando foi eliminado com 76% de votos.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Ramos Delgado, descanse em paz

O zagueiro argentino Ramos Delgado foi amicíssimo de Pelé nos tempos de Santos, entre 1967 e 1972. Nos últimos anos de vida, já radicado em seu país, foi diagnosticado como paciente do Mal de Alzheimer, uma doença degenerativa que implica em perda total da memória em pacientes terminais. Assim, meses antes da morte, no dia 3 de dezembro, José Manuel Ramos Delgado não identificaria Pelé se lhe mostrassem a foto do ‘rei’ do futebol.

Em estado terminal, o paciente de Alzheimer perde massa muscular e mobilidade, situação que contrasta com a compleição física vigorosa do período de jogador de Ramos Delgado, quando levava a campo a raça argentina. Se o Alzheimer em estágio avançado limita o enfermo a pronúncias de apenas algumas palavras, sem concatenar frases, no auge da carreira ele comandava a defesa aos berros, se necessário. Posicionava seu parceiro de zaga Joel Camargo e orientava os laterais Carlos Alberto Torres e Rildo. Logicamente se impunha pelo estilo clássico. Sabia antecipar, tomar a bola do adversário e sair jogando com categoria.

Há quem o compare ao antecessor Mauro Ramos de Oliveira, no Santos. Convém lembrar ainda que praticava um futebol com relativa semelhança ao zagueiro Ricardo Rocha, ex-Santa Cruz (PE), Guarani, São Paulo e Seleção Brasileira.

Ramos Delgado participou dos Mundiais de 1958 e 1962 pela Argentina, período em que os platinos se transferiam regularmente ao Brasil. O mesmo Santos, em busca de um goleiro para interceptar cruzamentos na marca de pênalti, contratou Agostín Mario Cejas.

A imigração de ‘boleiros’ argentinos começou a ganhar destaque nos anos 40 quando o Palmeiras foi buscar o zagueiro Luis Villa, de estilo clássico e incapaz de dar um pontapé no adversário. Em seguida o São Paulo trouxe o meia Sastre, que integrou um ataque formado por Luizinho, Sastre, Leônidas, Remo e Pardal. O time também contava com o futebol elegante do então zagueiro Armando Renganesch, que posteriormente se transformou num treinador qualificado. Mesmo destino seguiu o goleiro José Poy, quando abandonou a carreira de jogador do São Paulo. O diferencial era a filosofia de técnico disciplinador.

Na década de 60, na ganância de tentar ganhar a Copa Libertadores da América, o Palmeiras foi buscar em Buenos Aires o ‘matador’ Luis Artime, um emérito cabeceador. No mesmo período passou quase que despercebido no Juventus - clube da capital paulista - o então jogador Cesar Luis Menotti, que posteriormente conquistou o título mundial como técnico da Seleção Argentina na Copa do Mundo de 1978. Na mesma época, o Cruzeiro se garantia na defesa com o futebol eficiente do zagueiro Perfumo, enquanto o Flamengo dependia dos gols do centroavante Doval, que morreu aos 46 anos de idade, em 1991, ao sofrer enfarte fulminante.