domingo, 28 de junho de 2015

Saudoso treinador Carlinhos priorizava a técnica

 O estilo do saudoso treinador Luís Carlos Nunes da Silva, o Carlinhos, falecido dia 22 de junho passado, nada tinha a ver com a atual treinadorzada que esgoela a beira de gramados para transmitir instruções aos jogadores de suas respectivas equipes. A voz mansa e fina de Carlinhos só era ouvida, do banco de reservas, quando o boleiro de seu time aparecia para cobranças de laterais.
 Na concepção de Carlinhos mais valia a preparação do time no pré-jogo. Por isso trabalhava incessantemente a valorização de posse de bola. Como? Nos treinos havia predominância do tipo ‘dois toques’. E para aproximar os jogadores ele priorizava apenas metade do gramado nos trabalhos técnicos. Também sabia explorar pontos falhos de adversários aplicando exaustivos ensaios de jogadas.
 Carlinhos não se prendia basicamente a conceitos táticos. Aprimorava tecnicamente seus jogadores de forma que o desarme ocorresse sem praticar faltas. Em linhas gerais, orientava os seus marcadores que o bom posicionamento possibilitava o tempo exato para antecipação nas jogadas em vez de marcação implacável. E, de posse bola, cobrava que o passe feito corretamente.
 Isso ele fazia com extrema categoria nos tempos de jogador do Flamengo de 1958 a 1969, atuando como volante. E o estilo clássico, que fazia o time jogar por música, rendeu-lhe o apelido de violino, 23 gols em 517 partidas, e o prêmio Belfort Duarte destinado a jogadores sem expulsão na carreira.
 Por isso nunca escondeu a mágoa ao ter sido relegado pelo treinador Aimoré Moreira à Copa do Mundo de 1962 no Chile, quando o Brasil conquistou o bicampeonato. Considerava-se melhor que o palmeirense Zequinha - reserva de Zito - e por isso cobrava vaga entre os 22 relacionados naquela competição. A única oportunidade na Seleção Brasileira foi em 1964 num amistoso contra Portugal.
 Dois anos depois, foi um dos destaques do time flamenguista que perdeu o título do Campeonato Carioca na briguenta final contra o Bangu, com time base formado por Franz; Murilo, Ditão, Jaime e Paulo Henrique; Carlinhos e Nelsinho; Carlos Alberto, Almir Pernambuquinho, Silva e Osvaldo II. O público pagante na época foi de 143.978 torcedores no Estádio do Maracanã.
 Após pendurar as chuteiras como atleta, Carlinhos não deixou de freqüentar a sede da Gávea. Era viciado no baralho, com preferência pelo buraco. Assim, bastava o Flamengo enroscar em competições para que ele fosse chamado como técnico tampão. E isso se repetiu por cinco vezes a partir de 1983, sempre tentando fazer o time jogar ao seu estilo: futebol técnico e ofensivo.

 Carlinhos ainda teve passagens como treinador no Guarani e Remo, mas não conseguia se distanciar do Rio de Janeiro e degustar o chopinho com amigos. Aos 77 anos de idade sofria complicações no sistema circulatório e já havia perdido a memória. 

domingo, 21 de junho de 2015

Paquito e Tião Abatiá, a dupla no Paraná

 Está em desuso a expressão dupla de área de ataque, outrora corriqueira no futebol. Elas consistiam em um atacante centralizado - o centroavante -, que tinha como companheiro bem próximo o meia-atacante, cuja nomenclatura era meia-direita ou meia-esquerda, geralmente condutor de bola, driblador, e homem gol.
 A mais famosa das duplas de ataque foi Pelé e Coutinho no Santos, com tabelinhas inigualáveis. Posteriormente Toninho Guerreiro sucedeu Coutinho e as tabelas rarearam. Outros exemplos de famosos que fizeram essas duplas foram Sócrates e Casagrande no Corinthians, César e Leivinha no Palmeiras, Tostão e Evaldo no Cruzeiro, entre tantas outras.
 Foram registrados casos de duplas formadas originariamente em um clube e posteriormente migradas para outro. A mais badalada foi batizada de ‘casal 20’, formada por Washington e Assis, ambos falecidos, que transportaram o sucesso do Atlético Paranaense para o Fluminense. Maritaca e Téia saíram da Ferroviária de Araraquara - interior paulista - no final dos anos 60, para remontarem a dupla no São Paulo. Amoroso e Luizão, revelados na base do Guarani em meados da década de 90, tiveram reencontro no São Paulo em 2005.
 O futebol paranaense também foi brindado pela dupla Paquito e Tião Abatiá, cuja parceria se repetiu em três clubes daquele Estado. Paquito, o septuagenário José Martins Masso, paulista de Ribeirão do Sul, já estava no União Bandeirantes há um ano com a chegada de Tião Abatia em 1966. Caprichosamente a dupla disputava a artilharia da competição regional, sem que isso caracterizasse rivalidade entre ambos. O companheiro melhor colocado para marcar o gol sempre era servido, e assim prosseguia o bom relacionamento fora de campo.
 Quem suspeitou que a dupla fosse desfeita com o empréstimo de Paquito ao Coritiba em 1969, para a disputa do Torneio Roberto Gomes Pedrosa, o Robertão, se equivocou. Ambos se reencontraram no União Bandeirantes na temporada seguinte com repertório de habilidade, velocidade e gols. E juntos permaneceram mais alguns anos quando o Coritiba optou por contratá-los em 1971, ano em que a Revista Placar homenageou Tião Abatia com a ‘Bola de Prata’, por ter sido eleito o melhor centroavante do Brasil, e que o atleta já havia passado discretamente pelo São Paulo.
 O apelido Abatiá advém da cidade paranaense em que nasceu e foi registrado com o nome de Sebastião José Ferri. Ele foi um centroavante de caixa torácica avantajada e protegia bem a bola antes do giro e finalização. Assim, em 1972 foi cotado para integrar a Seleção Brasileira na Taça Independência, mas o sonho acabou com a fratura na perna em jogo contra o Cianorte.

 Quis o destino que Tião Abatiá e Paquito se reencontrassem no Grêmio Maringá sem o brilho de outrora. Em comum entre ambos consta ainda o ano de nascimento: 1945.

segunda-feira, 15 de junho de 2015

Adeus ao volante, líder e fazendeiro Zito

 Em março de 2002, no terceiro ano consecutivo da coluna, o homenageado foi José Eli de Miranda, o Zito, volante bicampeão brasileiro pela Seleção e de mundial de clubes. Neste 14 de junho, aos 82 anos de idade, Zito morreu em Santos em decorrência de um ACV (Acidente Vascular Cerebral).
 Há 15 anos Zito foi citado como o pecuarista que calçava botas sete léguas de vez em quando para acompanhar o gado no pasto, antes de o dia clarear, em sua fazenda de 50 alqueires em Pindamonhangaba (SP). E quando enjoava do cheiro de mato voltava à residência em Santos e aproveitava a ociosidade para jogar conversa fora no Posto do Lalá, ex-goleiro santista, reduto de boleiros do Peixe das décadas de 50 e 60.
 Naquela roda Zito comunicava aos desavisados que o seu estilo raçudo, boa marcação e projeção com bola ao ataque havia sido determinante para ganhar a posição de Dino Sani na terceira rodada da Copa do Mundo de 1958, na Suécia, na histórica vitória por 2 a 0 sobre a então União Soviética.
 Naquele jogo o treinador brasileiro Vicente Feola também trocou o ponteiro-direito Joel por Garrincha e Dida por Pelé. Antes, no empate sem gols com a Inglaterra, já havia optado por Vavá no lugar de Mazola, num time que terminou a competição com Gilmar; Djalma Santos, Belini, Orlando e Nilton Santos; Zito e Didi; Garrincha, Vavá, Pelé e Zagallo.
 Zito surgiu no Santos na década de 50 e em 1957 já era o capitão da equipe do tipo mandão. Se preciso fosse encararia até Pelé com dedo em riste. Naquele ano o time era formado por Manga; Nilson e Feijó; Ramiro, Formiga e Zito; Tite, Del Vechio, Pagão, Jair (Pelé) e Pepe.
 Zito tinha bom passe e de vez em quando fazia alguns golzinhos, três deles na Seleção Brasileira nos exatos 50 jogos que participou. Ele contou que o gol mais importante na carreira foi na virada de placar contra a Tchecoslováquia na final da Copa do Mundo de 1962, no Chile. Aos 25 minutos do segundo tempo, Amarildo cruzou e ele, de cabeça, fez 2 a 1. Depois Vavá selou o bicampeonato num time dirigido pelo treinador Aimoré Moreira e com Nilton Santos como único remanescente da defesa titular de 1958. O quarteto defensivo de 1962 tinha Djalma Santos, Mauro, Zózimo e Nilton Santos.
 Zito foi um colecionador de títulos paulistas no Santos, única camisa que clubes que vestiu: 58, 60, 61, 62, 64, 65 e 67. Um ano depois pendurou as chuteiras após o Santos ter descoberto o seu sucessor: Clodoaldo.
 Zito torceu o nariz com o surgimento do volante de contenção criado pelo Fluminense em 1964, com Denílson. A moda pegou e hoje é comum os clubes adotarem até três pegadores no setor.

 Além de bois e imóveis, a bola deu-lhe uma empresa de artefatos de borracha, com cerca de 100 funcionários, administrada pelo filho Júnior. Zito foi supervisor e diretor do Santos, mas por fim preferiu sombra e água fresca. Afinal merecia. 

segunda-feira, 8 de junho de 2015

Carbajal, primeiro atleta de cinco Copas do Mundo

 Na vitória da Seleção Brasileira sobre o México por 2 a 0, em jogo preparatório à Copa América de 2015, o meia Phillippe Coutinho marcou o primeiro gol com finalização totalmente sem ângulo e a bola passou entre a trave direita e o goleiro Corona, que deixou de fechar o ângulo prevendo que haveria cruzamento na jogada.
 Nas últimas décadas o selecionado mexicano tem carecido de goleiros que transmitam integral segurança, fato que contrasta com as décadas de 50 e 60 quando Antonio Feliz Carbajal Rodrigues esbanjava toda categoria, tanto que participou de cinco Copas do Mundo seguidamente, de 1950 a 1966. Com 86 anos de idade completados no dia sete de junho passado, Carbajal reside na cidade mexicana de Leon, embora tenha nascido na Cidade do México.
 Por ter sido o primeiro atleta no planeta a participar de cinco Copas, Carbajal foi homenageado pela Fifa. Depois dele, outros dois jogadores europeus também atingiram aquele limite de participações na competição mundial. O polêmico alemão Lothar Matthaeus defendeu o seu selecionado de 1982 a 1998 ininterruptamente como atleta, e posteriormente migrou para a função de treinador. Já o goleiro italiano Gianluigi Buffon, presente em cinco Copas desde 1998, ficou na reserva na primeira participação, quando o evento foi sediado pela França.
 Carbajal, 1,86m de altura, já mostrava agilidade na passagem pela seleção olímpica do México em 1948, virtude que lhe garantiu titularidade na equipe principal na Copa do Mundo de 1950, disputada no Brasil. A despedida do goleiro naquele selecionado deu-se no dia 19 de junho de 1996 no empate sem gols contra o Uruguai, no Estádio de Wembley, diante de 61 mil torcedores.
 Naquela competição o México perdeu para a Inglaterra por 2 a 0 com time base formado por Carbajal; Pena, Chaires, Nunes e Dias; Hernandes e Mercado; Cuneros, Borja, Rajes e Padilha. Nos outros dois jogos das oitavas-de-final o time empatou: 1 a 1 com a França e 0 a 0 com o Uruguai dos ídolos Mazurkiewicz, Pedro Rocha, Ubinas e Vieras.
 Coincidência ou não, no período de Carbajal o México sempre garantia vaga nas eliminatórias para as Copas, contrastando com instabilidade posterior. Em 1970 e 1986 a participação dele foi garantida por ter sido país sede da competição, mas em 1974 perdeu vaga em disputa contra país de pouca expressão no futebol, caso do Haiti. Em 1982, quando a Fifa aumentou o número de participantes de 16 para 24, o México ficou de fora e viu Honduras e El Salvador serem incluídos.

 Carbajal ainda esteve ligado ao futebol como preparador de goleiros e treinador de equipes enquanto gozava de plena saúde para o exercício das respectivas funções. De certo lamenta a pobreza técnica do selecionado de seu país, diferentemente do período em que jogava, quando endurecia partidas contra respeitados adversários.