Jorge Vieira, bola e conversa
A morte do treinador Jorge Vieira no dia 24 de
julho passado, aos 78 anos de idade, nos remete não apenas ao seu histórico vencedor
no futebol como alguns destemperos verbais do então jogador Emerson Leão e do ex-presidente
da Federação Baiana de Futebol, Márcio Oliveira.
Em coluna que publiquei no dia 16 de novembro
de 2001, quando me reportei à Copa América de 1983, reproduzi manchetes da mídia
impressa com citações de que Vieira estava cotado para substituir Carlos Alberto
Parreira no comando da Seleção Brasileira.
Tinha lógica a especulação. Afinal, a nau estava
à deriva, e Vieira era um profissional afinado com o então presidente da CBF,
Guilitte Coutinho. Logo, ambos poderiam reviver a dobradinha dos tempos de América
do Rio, quando Coutinho presidiu o clube.
No período de turbulência daquela Copa América,
às vésperas de um jogo decisivo contra o Uruguai, em Salvador, o então goleiro
Leão transmitiu péssimo conselho aos companheiros: “O futebol belo não
interessa. Se for preciso violência, que sejamos violentos. Assim é que se faz
um campeão”.
De certo, 29 anos depois, Leão deve se
envergonhar quando alguém lembra tamanha bobagem falada na época. Márcio
Oliveira também perdeu uma grande oportunidade de ficar calado, quando prometeu
escalar gandulas especialistas em retardar ou apressar o jogo de acordo com as
conveniências.
Nos tempos de Jorge Vieira no futebol a metodologia
de trabalho da maioria dos treinadores era diferente. Se hoje o profissional é
disciplinador, em consonância com a cartilha do profissionalismo, outrora levava-se
‘o boleiro’ na boa conversa, na base da psicologia da bola.
Vieira foi um carioca que conhecia toda
artimanha da boleirada, e sabia se fingir de míope para posteriormente mostrar
que sempre esteve com os olhos bem arregalados.
Deixava o boleiro pensar que o estava
enrolando durante o treino, mas no dia do jogo, na velha conversa ao pé do
ouvido, exigia que o dito cujo desse a necessária resposta em campo.
Seu histórico como técnico de futebol começou no
lendário time do América do Rio, na década de 60, com jogadores do nível de
Romeiro, Alarcon, Canário e Leônidas, que não era o Diamante Negro.
Em 1976, já na Ponte Preta, ganhou o apelido
de ‘ponta aérea’ porque cumpria a sagrada agenda de se mandar de avião para o Rio
de Janeiro logo após os jogos, e retornava na terça-feira à tarde ou
quarta-feira pela manhã. Na época, segunda-feira era dia de descanso dos
jogadores. Na terça-feira pela manhã a programação quase unânime de comissões técnicas
previa treinos físicos.
Vieira montou o belo time do Botafogo de
Ribeirão Preto em 1977, ajudou a lapidar jogadores como Sócrates e Geraldão, e
ganhou fama de estrategista, tanto que logo acabou contratado pelo Corinthians,
um time que jogava por música em 1983.