Palavreado usado pela boleira foi agregado a
incríveis metáforas. Ladrão é não apenas quem se apodera de objetos e dinheiro da
vítima. Também é o atleta adversário que consegue o desarme, ou ‘rouba’ a bola.
Companheiros de equipes alertam sobre a aproximação do ‘ladrão’, sem que haja
reação intempestiva de quaisquer das partes. E locutores de rádio citam que
fulano 'bateu a carteira' de sicrano.
Um dia um filósofo de botequim usou o bordão ‘chute
do meio da rua’, que nada mais é de que chute de longa distância, como se o gramado fosse pavimento asfáltico. E basta o lateral encontrar espaço para
avanço ao ataque pra que recorram às metáforas corredor e avenida. Zagueiro de
caixa torácica avantajada é armário ou guarda-roupa. E quem dispõe de
musculatura forte é chamado de cavalo.
O reino dos animais emprestou outras metáforas
ao futebol. Quem opta por marcação implacável sobre adversário é carrapato
ou mordedor, sem que se faça alusão direta a um cão.
Só na bola o centroavante artilheiro é
identificado como 'matador', sem ficha criminal. Os paradoxos da bola o transforma
em sujeito irritado quando se depara com zagueiro que 'mata' a jogada, expressão
atribuída àquele que abusa dos lances de falta.
Jogador com essa característica é apelidado de
xerifão, e não se constrange de chutar a bola de bico para tirá-la das
imediações de sua área. Chutar de bico, na linguagem de boleiro, é injeção.
Chute muito forte é conceituado como canhão. O
ex-ponteiro-esquerdo Pepe, que furava redes adversárias nos tempos de Santos,
nas décadas de 50 e 60, ainda é identificado como ‘canhão da vila’. Chute de
curva com a parte externa do pé é o tal de três dedos ou rosca. O
ex-lateral-direito Nelinho, que jogou no Cruzeiro e Atlético (MG), foi quem
mais se aproximou da perfeição.
Já o passe com muita força é ironizado como ‘tijolo’. Craque alisa, acaricia ou penteia a bola, enquanto o cabeça-de-bagre (jogador
fraco) judia dela. Jogador que abusa de dribles improdutivos é aquele que
amarra a bola ou enceradeira.
Décadas passadas, tecnocratas do futebol
inventaram a tal de segunda a bola, que nada mais é do que a bola do rebote. E
goleiro que a rebate para o interior de sua área é chamado de mão de pau. Já o
atacante da diagonal ponta ao centro, ou vice-versa, faz o ‘rabo de vaca’. Justificativa?
A vaca balança o rabo para os dois lados.
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